quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Berlim: do you still need a ticket

Easyjet, ABCDs, maçãs energéticas, aquela piscada, Muro de Berlim, Gordon W, ingresso premiado, estréia na Copa, tor!, promessa, a “era do suco”, croatas, scheißes e muito mais

Dia 13 – terça-feira [ ] No aeroporto francês de Orly (ao sul de Paris) já encontrei animados Brazucas prestes a embarcar no air-bus da Easyjet. Recordo de um grupo de pernambucanos e um carioca com quem sentei ao lado. Em duas fotos registrei a descontração pré-Copa. Primeiro vôo low fare (baixo custo) que fiz, fiquei mal acostumado com a TAM, aqui não tem reserva de assento, quem chegar primeiro, senta. E sobre refeições, tem menu pra escolher. E pagar, lógico. Mas dependendo do preço que se paga no bilhete, compensa.

Primeiro desafio alemão: achar o albergue do amigo Thiago. Por meio de torpedos e ligações fui chegando no Heart of Gold, só não fiz reserva antecipada, pois exigia o mínimo de três dias. O meu ficava na parte comunista da cidade e achei melhor ir lá somente para dormir. Depois de andar em círculo, perdendo uns 15 minutos, cheguei na morada dos meus três amigos, Thiago, Edson Veião e Rodrigo Faggi. Os “ABC”, pois Veião mora em Santo André, Faggi em São Bernardo e Thiago, em São Caetano. Eu me intrometo e insiro o primo pobre da turma, o “D” de Diadema – tá completo o ABCD –, que além de ser o menos favorecido economicamente, não é nem “são”, logo é “bêbado”. Foi bacana revê-los em solo alemão, aproveitei também para conhecer a cearense Niara, que mora em Bilbao, Espanha. Detalhe: ela já estava “bêba”, à toda pilha 10h da manhã, e de chapéu de vaqueiro. A decepção foi a guia de Praga (por morar lá) do Thiago, a Liz. “Ela está aqui, é feia, muito chata e já rodou a banca com os gringos do albergue”, resignou-se. Além de ter dormido no corredor com as coisas à mostra.

Tão logo cheguei, já botei minhas malas no carro (Golf) alugado deles. Aproveito para já contar quão fuxiqueiros, além de modernos, são os veículos daqui. O deles, todas as vezes que dava marcha-ré, um sensor avisava a proximidade com qualquer objeto, para evitar colisões. Já o do-you-sit-móvel, do Zadá, dedava quando algum passageiro não colocava o cinto de segurança. Dava piti mesmo! No ritmo da tecnologia, os próximos não serão muito amigos: eles virão com automulta, ou seja, deu mancada no trânsito já se imprime o recibo da multa. E ainda terá a funcionalidade de inserir o cartão de crédito para quitar a dívida...

Sempre parte interessante na descoberta de um novo país é conhecer as prateleiras dos supermercados, a saber, os diferentes produtos, suas embalagens, as promoções e os compradores. Um detalhe de extrema coincidência: o supermercado se chamava Extra, mas acredito que não tenha nenhum parentesco com o de cá. Nossa compra incluiu hanutas (biscoitos alemães com as fotos dos craques locais), água (sempre cara e no calor – essencial – na Europa) e uma dúzia de maçãs, daí se popularizou a frase do Faggi: “É bom comer maçã pois é energética!” Repetimos tanto quanto mastigamos a fruta – ficamos “enfagiados”. Nesse supermercado, uma outra compra, aparentemente banal, ficará guardada para mim: a lata de coca que tomei. Mal sabia que seria a última do ano. Mas isso é outra história que já chego, parágrafos adiante.

O turismo obrigatório na capital germânica são os restos da Segunda Guerra Mundial, e que maior e concreto símbolo que o Muro de Berlim. Na área central o que há são marcas de paralelepípedo onde passava o Muro que separava mais do que Berlim – ou Alemanha – Ocidental de Oriental, e politicamente, separava capitalistas de comunistas. EUA da ex-URSS. Além disso, cruzes brancas, com o nome e data da morte do infeliz e corajoso (Ingo Kruger – 10/12/1961) que tentou cruzar o muro e recebeu tiros. Tempos de Guerra Fria e sangria que não deixaram saudades.

Ao menos para mim foi impossível ficar indiferente à energia negra do local. Embrulhou o estômago, quase passei mal. Perto, o Holocausto, um monumento aos judeus mortos na guerra. Fatos engraçados em meio à sombria atmosfera: todos os ABCDs estavam em cima dos túmulos pretos, Faggi usou humor negro e se deitou num dos túmulos. Fotografando e filmando; Veião, indiscretamente, clicou o “cofrinho” de uma morena brasileira de calcinha branca e marido branquelo (um europeu). Olha a Julia Roberts brasileira... Thiago avisou: “Vocês são loucos, olha o cara lá!”; a melhor foi uma enérgica guarda que me repreendeu com “stop it, go down”. Pateticamente, ao invés de descer, o reflexo surpreso me fez pular para outro túmulo (?!?).

Parte da Copa, as Fan Fests. Telões, estrutura de arquibancadas, produtos do Mundial, mini-campos, cambistas, personagens do mundo inteiro etc. A de Berlim ficava estrategicamente no histórico Portão. Próximo, perguntei ao vendedor o valor de uma camisa do Brasil. Além de vendedor, era o nosso folclórico membro da Comunidade, Adalberto. Dono do Jeguehome me disse o preço, “são 40 euros”, interrompi questionando se para amigos teria descontos. Ele então reconheceu e abraçou-me. O sol castigava, principalmente o mais europeus dos brasileiros, Faggi, que improvisava a bandeira nacional como burka, “o véu do Faggi”. Ele, que todos que não o conhecem, juram que é nórdico tal é sua pele escandinava. Tem até uma verdadeira história: tomava sua cerveja, desfilando seu meigo capacete viking de pelúcia – vulgo chifre – comprado na Dinamarca, quando um par de ingleses preconceituosos e bêbados disseram: “There is a fucking danish [dinamarquês] by my side...” Ele não se conteve e corrigiu: “I am brazilian....” Eles rasgaram a boca. Ao lado do fucking scandinavian, o Thiago com sua bandeira quadriculada em verde e amarela, com o símbolo do nosso querido Corinthians ao centro. Também escrito “É nóis na Copa”, que aliás, é seu blog.

À tarde Zadá me liga. Num quiosque próximo meu primeiro contato com o bratwurst, uma salsicha imensa (já escuto os maliciosos...) com um pão. Pagava com o Zadá, e a Tiazinha berlinense perguntou um algo qualquer que não entendi tampouco respondi. “Ela te mandou à merda, Zé!” Zadá traduziu o gesto dela com a mão. Nem liguei.


“Não passava nem agulhinha,nem pensamento” – Zadá contando que estava na fila do Ticket Center e presenciou que o ingresso de um rapaz a sua frente não estava na lista, e o cara tinha confirmação. Reclamou, xingou, esperneou e mais, ameaçou dedo em riste: “Em 2014 o Brasil vai ensinar como se organiza uma Copa, seus mutreteiros!”. Que heresia!!! A confusão deixou o Zadinha cagando fino, suando frio e rezando pra Padinho Ciço. Ufa, o ingresso dele estava lá.

Muitas fotos com os simpáticos croatas nos arredores da Fan Fest. Ah, as croatas! En-can-ta-do-ras-!-!-! Num pedaço do que filmei escuto o Veião babando: “Olha aquela croata!” E aquela postada em frente à mesa que estávamos provando da iguaria alemã? Essa me fez provar seu charme. Eu olhava porque sua beleza pedia admiração. De repente e sutilmente, um gesto partiu como um tiro – uma piscada! Fulminante, me atingiu em cheio. Quase derrubou. Antes fiquei na dúvida: será pra mim? Desfeita por uma testemunha. “Caralho, Zé!!! Olha a piscada que ela te deu, véio!!!” Veião exclamou enfático. O dia estava ganho – a viagem, exageram alguns –, não precisava mais e nem caberia um próximo passo. Sua doce gentileza, sem palavras, se eternizou assim...

Estreei em Fan Fests em Berlim, o jogo era Coréia vs Togo. Julgava que tinha que pagar, nada só numa estrutura de arquibancada cobrava. Zadá, fetichiado por asiáticas, queria uma foto com as coreanas. Cliquei. Eu preferi ser fotografado com uma bela germânica (foto) que fazia questionários acerca da Copa. Voltando ao telão, gol dos coreanos, celebrado com bumbo e gritos característicos da última Copa, na própria Coréia do Sul, em que eles foram empurrados pelos árbitros ladrões até a Semi. Eu abrasileirei-o assim o barrulho do tambor: “Terra à vista, turum-turum!” Zadá tinha sua versão: “Meu amigo, turum-turum!” O placar final foi Coréia 3x1, de virada, turum-turum!

Comecei a ficar preocupado, pois ainda não havia ido a meu albergue, aproveitei a carona do Veião que fora usar o banheiro (número 2, acho...) no albergue e tratei de primeiro: saber se podia ficar nesse albergue? Não, lotado; então liguei no meu albergue e pedi para segurarem reserva. Ao voltar à praça, uma informação do Faggi. “Um croata apareceu e vende um ingresso por 300 euros. Deixou telefone.” Não titubeei e liguei, oferecendo 200, a qual ele rechaçou. “Ok, caso mude de idéia, me avise.” A hora da estréia brasileira se aproximava. Mesmo não tendo ingresso gostaria de tirar fotos do Estádio Olímpico, que tem toda uma história ligada ao nazismo de Adolf Hitler. O palco dos Jogos Olímpicos de 1936, onde o americano – e negro – Jessé Owens calou o ditador com sua vitória no atletismo. Acompanhei a van da Bahia ao estádio: Thiago, Zadá e Mauricio tinham passaporte para o jogo.

“Do you still need a ticket?”, sem sombra de dúvidas uma das mais felizes mensagens de celular que recebi na vida. No ato já disquei para o croata, pois se ligou é porque concordaria em vender por 200. Informei-lhe que assim que chegasse no campo retornaria ligação. De frente à estação de metrô do estádio ouvi dele que chegaria em 15 minutos. 20, 30, 40, 50... De certo, já havia vendido, estavam pedindo de 300 pra mais. Encontrei um brasileiro que havia encontrado antes, ele ia atrás de outro esquema de ingresso. O acompanhei, me distanciando uns 20 minutos do local, quando chegou outra mensagem de “onde você está” do croata. Voltei tudo... olha a saga! Eu dizia: “Estou no meio da rua balançando os braços com a camisa do Ronaldinho Gaúcho!” Cinco minutos de mico e, finalmente, me aparece um jovem alto com a quadriculada camisa da Croácia.


Curiosamente o envelope que ele me entregou estava escrito “roba”. Posteriormente descobri com minha amiga croata que significa “roupas”. Preocupei-me com a veracidade do ingresso. “É verdadeiro, comprei na Federação Croata.” Além da convicção do cara, ele acompanhou-me conversando até a entrada. Quando algo inesperado aconteceu: o croata introduziu o bilhete na catraca e o sistema não leu o código de barras, o funcionário pediu pra ele se afastar. Pensei que ocorreria o mesmo comigo, nessa hipótese pegaria minha grana de volta. Não, deu sinal verde. ENTREI. Não atinei para o absurdo dos recentes fatos. Claro que fiquei preocupado com a infelicidade dele, liguei perguntando o que havia acontecido. “Vou resolver, pode entrar”, disse ele. Todas as vezes que penso na situação chego à conclusão que não tive culpa, afinal paguei mais de quatro vezes o valor real do ingresso (45 euros) e, acima de tudo, ERA PRA EU ENTRAR EM UM JOGO DE COPA DO MUNDO DO BRASIL.

Refeito do inusitado episódio, e emocionado, tirei fotos vitoriosas com o ingresso na mão, na minha cabeça ele já era um troféu, um futuro quadro, com a assinatura das pessoas que acompanharam o sofrimento que foi consegui-lo. Lembrei da promessa: a partir de agora um ano sem refrigerantes, pra arredondar a data do meu 33º aniversário, dia 16, um ano e três dias. Dirigi-me aonde era meu assento, atrás do gol. Na torcida da Croácia. Era mais acima de onde parei, mas como estava muito congestionada e só via vermelho e branco, estacionei de pé nas escadas. Caso alguém reclamasse, iria para o meu assento. Apesar de haver um grande número de camisas amarelas, era visível que quem as vestiam eram gringos. No meu caso não dava pra disfarçar a brasilidade. Senti-me “um invasor” no terreno inimigo. Um toque no ombro me trouxe receio. Era um amigo croata pedindo foto (abaixo). Desarmei-me. Puta bobagem, meu referencial até então era as animalescas torcidas paulistanas.

Hino nacional toca os brios do patriotismo, estando presente numa das suas execuções mais tradicionais, emociona e tira lágrimas sim. Cantei a plenos pulmões. Certamente o único a pronunciar português no local. Sinceramente “I am from Brazil” é respondido a gringos por mim com firmeza e orgulho – tá nos documentos! Independente de problemas sociais, atraso cultural, escândalos políticos, desorganização no futebol etc. Sou brasileiro pra sempre!

Dentro das quatro linhas, os brasileiros fizeram somente para o gasto na estréia e tomaram sufoco dos europeus. Kaká foi o destaque com um golaço de fora da área, dando pinta de que brilharia na Copa. No confronto de torcidas apontava um placar dilatado em favor desse país dos Bálcãs. Povo sofrido, que soube transformar suas agruras de uma recente guerra civil em vibração, união, força. Era de arrepiar o grito de guerra croata, que vinha em dois tempos. No meio do segundo tempo uma fogueira se acendeu para inflamar mais ainda o espírito da torcida. Não estive presente no lado brazuca, mas a opinião geral é essa: nós, como torcida, um bloco organizado, inexistimos, não representamos todo o poderio técnico e de prestígio da Seleção Pentacampeão. Nesse aspecto faltou os torcedores profissionais, quem lembra do Dartagnan da corneta? Nos limitamos a cantar o bonito – mas batido “sou brasileiro, com muito orgulho e muito amor...” Só e muito pouco. Eu acho que a grande maioria se preocupa mais em torcer pelos próprios times do que o país. Discordo, eu simplesmente separo Corinthians do Brasil. Torço três anos e onze meses pelo clube, um único mês sou todo verde-e-amarelo.

Ao fim do jogo, voltei de metrô sozinho presenciando a algazarra que só os meus patrícios sabem fazer de samba etc. Não consegui contato com Zadá e Thiago no estádio. No albergue, o funcionário foi extremamente by the book ao não chamar Veião e Faggi, caso estivessem dormindo (já era meia noite). Precisava pegar minhas malas no carro deles e rumar para meu albergue. Jantei próximo, e foi dado início a “era do suco”, já que refrigerantes, definitivamente, não beberei em 2006. Um sacrifício e tanto, e contando com as freqüentes provocações dos amigos. “Zé, não quer coca mesmo?! Tem certeza que não? Tá calor e tá um delicia?!” Agüentei firme, afinal promessa é promessa, descumpri-la é mentir para si mesmo e para o universo, por tabela.


Eles chegaram, tomamos uma rodada de cervejas e, às 3h da madrugada, me levaram para o All in Hostall. Cara, pelo horário e falta de almas na rua, o local parecia sinistro! No lado comunista parecia que fantasmas do derrotado sistema nos rondavam... Balelas à parte, dormi feito pedra. Dia seguinte, poderia ir de carro à Praga, com a Iglaci (Tia Glá) e seu sobrinho, Edson “Nê”, mas achei melhor conhecer mais da interessantíssima Berlim, já que eles viajariam super cedo, e deixar a carona para os ABCs, no Brasil mesmo pensei em passar a bola para Thiago e cia.

Dia 14 – quarta-feira [ ] 12h45 levantei. Meu café-da-manhã comprei no pequeno mercado: suco e biscoitos, a qual comi na bancada da vendinha. Também guardei um simples costume alemão – diria que europeu – muito saudável: o uso da bicicleta como meio-de-transporte, uma moça chegou, estacionou a bicicleta, comprou e saiu. Na seqüência iria visitar o Muro. Em tempos de Copa do Mundo o turismo perde pra futebol. No restaurante italiano, passava Espanha vs Ucrânia, um passeio de 4x0 da Fúria Española sobre Sheva e cia. O personagem da vez era do Canadá, até no nome era figura: Gordon W. Adorava conversar, de longe se notava o carisma do cinquentão, que a julgar pela florida camisa é um bon vivant. Também um cigano do mundo. Pagou-me cerveja explicando que a marca de cerveja Budweiser, era tcheca por isso os americanos perderam na justiça e mudaram o nome da famosa para somente Bud. Antes de eu partir, ele deixou convite verbal e endereço do bar onde trabalhava como cozinheiro, e passaria o segundo jogo dos donos da casa contra os poloneses.

Muro de Berlim, o símbolo da intolerância virou souvenir. Pedaços do concreto da Guerra Fria são vendidos em postais. O vendedor foi frio ao constatar: “Sofri muito no passado e hoje ganhamos com o turismo.” Tirei lascas do muro pra levar a amigos amantes de história, mas guardei tão bem guardado que nem eu achei depois. E um trecho do Muro – East Galerie – está todo pintado por artistas e pichados com frases ideológicas de ontem e de hoje. Plagiei a foto de dois turistas: um ajudando o outro a pular o muro (foto). A mesma brincadeira há 16 anos não seria encarada dessa forma pelos sisudos oficiais alemães da Gestapo. Ratátátá! E é um muro oriental (onde estava), um rio separando e outro muro, no lado ocidental. Tudo – na época – vigiado por olhos invisíveis e metralhadores inapeláveis. Ai de quem quisesse pular o muro... Ra-tá-tá-tá!

Do ex-comunismo para o centro, parada na torre Alexander Platz, um marco do socialismo. Daí a intenção era ir até a Fan Fest do Portão de Brandemburgo para ver o jogo da Alemanha. Uma alemã confirmou que estava no trem correto, mas ocorre que além da demora, visualizei pela janela matas. Opa, tou no interior de Berlim!? Desconfiei e repeti à mina que se ofereceu a dar a informação: “Brandemburgo Tor [Portão e também “gol”]?” Mal-entendido, ela pensou que queria ir para a cidade de Brandemburgo e ficou com cara de pastel. Ainda tomei canseiras de sobe-e-desces até tomar o rumo certo, antes disso, numa loja da DB - Deutsch Bahn (principal companhia de trem alemã), comprei a passagem de Berlim à Praga, por cerca de 50 euros, saindo na madrugada do dia seguinte.

Com o tempo que perdi na ida, me restava o consolo de assistir ao jogo com o Gordon W. Mas para a cagada ficar completa, tinha que ser round trip, ou seja, ida-e-volta. Não sei que zica que deu que estava alerta na estação Warshaw (Varsóvia em alemão), pois desceria na próxima. E o trem sumiu por minutos e não parava?! Simplesmente não era linha de metrô aquela, sim de trem, logo com um itinerário semelhante, mas não igual. Scheiße!!! (merda, uma das únicas palavras que meus ouvidos conseguem captar nesse idioma que fode a amizade). Um casal me esclareceu sobre o equívoco. Nos vagões de trens e metrôs é permitido carregar bicicletas. Uma delas pertencia a uma moça alta, brasileira de Araraquara que me deixou no ponto de pegar o metrô. Ela ia assistir ao jogo dos alemães com os sogros. A Bela e sua byke se foram.

O primeiro tempo, por conta das patacoadas round trip, eu já tinha perdido. O metrô ainda demorou enquanto esperava minha linha ouvindo turcos, que são dois milhões em todo o país. Desci nas cercanias de onde Gordon havia me explicado ficar o tal bar, mas sem o endereço, que perdi. Tinha o nome – 123 – e o detalhe de que ele é ilustrado com um desenho de Ronaldinho Gaúcho. Fácil. Cheguei e o placar do jogo permanecia inalterado, 0x0. A torcida germânica, calculo umas 200 pessoas, se descabelavam de tensão. Duas bolas na trave na mesma jogada – a bola insistia em não querer entrar. Comecei a me incomodar com um cachorro inconveniente do torcedor vizinho roçando na minha perna. E minutos mais tarde a explosão do grito uníssono de T T T O O O R R R R R ! ! ! ! ! chegou forte. Neuville entrou no segundo tempo e de carrinho, quase nos descontos pôs fim a agonia dos anfitriões. Se bem que quando o juiz apitou o final do jogo não teve continuação de festa no bar, como se morresse a alegria. Foi o que notei ao menos. O fato de estar com a camisa vermelha e branca, do longínquo e nanico Anapolina de Goiás, fez uma alemã brincar se eu não estava com a camisa da Polônia, de similares cores.... rs... imagina?! Ainda bem que nenhum idiota não pediu pra eu tirá-la, assim como fazem nos estádios brasileiros.

Findo o jogo, bateu fome e como meu recente amigo é cozinheiro, lhe pedi para preparar sua refeição. Gordon W. garantiu que era a última da noite, uma massa redonda com carne e folhas ao centro. Delícia! Foi cortesia com outra cerveja. Logo mais chegou um croata na roda próximo ao quiosque – Martin –, que contou como foi sua experiência no Brasil e falou também sobre o significado do grito de guerra croata, o expressivo sentimento que emanou no jogo de ontem. É impressionante como todo croata que conheço só faz crescer a admiração por esse povo guerreiro! Assim vou pra Croácia. Quem sabe não encontro a Deusa que me piscou? Minhas chances são uma em um milhão, como diria outro Debilóide.

A decisão de passar a noite acordada foi lógica: minhas malas estavam no albergue e não compensaria pagar 25 euros pra dormir três horas, já que meu trem partiria 5 am. Gordon W. ia pra outro trampo próximo, nesse ele era músico. Uns 30 minutos de caminhada, chegamos na balada berlinense, à beira rio. Exótico local. A cantora era uma gata austríaca (foto). A performance dela com o Gordon W. misturava mímicas, mixagens, sonoplastia e o vocal suave da loira – uma salada só. Valeu o ingresso que não paguei! Sinceramente disse ao Gordon W. por conta dos erros – round trip – de tráfego, mais principalmente toda a gentileza: “You saved my day!”

Pra encerrar o assunto Berlim, da balada até o albergue, caminhando na madrugada de mãos dadas ao Muro – tudo deserto – caminhando pela história. Uns três quilômetros do que já foi 153. Um powerade sozinho para brindar inusitado momento e confesso: enriquecedor. Outra tarefa obrigatória: escrever à caneta o nome do meu amigo, companheiro filiado ao PC do B “GUI” no muro. Ele adorou estar presente no símbolo – ainda que caído – do socialismo. No albergue, peguei as malas e combinei um táxi, pra acertar o valor da curta corrida, o taxista, que não falava inglês apontou no mostrador o preço de mais ou menos 10 euros. Perfeitamente pagável a essa hora da matina.

No trem da DB me engajei com uma galera do Sul que ainda não tinha passagens. Compraram dentro dos vagões mesmo com os oficiais da empresa. Difícil a missão de dormir, pescava e nada. Quando consegui, parece mentira, mas uns coreanos lazarentos foram reclamar que estávamos nos assentos deles?! É o cu da cobra mesmo! Nem adiantou bater boca alegando que em nenhum lugar dizia sobre ter que reservar com antecedência. Levantamos e procuramos outra cabine de seis lugares. Breve, passaram os agentes de imigração tcheca pedindo passaporte para carimbar a entrada nesse país do Leste.

Próxima página: Praga, República Tcheca!

Paris: parada obrigatória

Greve, Piripaque Stadion, Árvore de Natal Gigante, jogador americano e taxi indesejado

Pra funcionários TAM aqui é parada obrigatória, porém e eba, até outubro, quando alçaremos vôo para Londres. Em Paris esnobei a amigos que, sinceramente era de fato obrigado a parar, isso porque essa é a terceira vez que visito a Cidade Luz e, principalmente, estava louco para encontrar a galera da comunidade do Orkut Copa 2006: eu vou, que marcaram encontro em Berlim, no Portão de Brandemburgo (“Luxemburgo”, apelidou o Zadinha). Só não fiz porque isso significaria quase uma centena de euros a mais. Fiquei, a contragosto, na capital francesa.

Passaporte novo estreado com carimbo e malas, frente e verso, pronto para ir para o Stade de France, que fica no sentido aeroporto – centro. Comemorei o fato de não ter que pagar 10 euros do trem – estava de greve –, só que na estação do palco da final da Copa de 98, simplesmente não abriu a porta. Já que foi assim decidi ir direto pro albergue descarregar malas e descansar. Não é que os trens estavam contra mim? O que peguei foi pra Saint Denis, parada do estádio. O erro meu se justificou, pois estava na plataforma correta, mas para saber qual das estações seria bastava ler no painel acima. Descobri tardiamente. E tomei outro baile mais adiante, tudo bem, faz parte do programa, ainda mais quando se considera minha aversão ao idioma napoleônico.

Nas ruas parisienses deparei com uma das tônicas dessa excursão européia: sol, e seco, que mata! Nunca pensei que fosse subir dos Trópicos para derreter no Hemisfério Norte. Para exemplificar lembro de uma francesa que andava poucos metros e borrifava um spray refrescante. Eu como não tinha spray fresco caminhava sob o peso das malas. Pronto, estava de frente ao Piripaque Stadion, aqui havia oito anos o mundo assistiu ao ataque de Ronaldo e o seguinte banho dos franceses nos brasileiros. Até hoje eles sacaneiam com “et un, et dos, et troux e et zéro” e até hoje não se sabe ao certo o que aconteceu naquela tarde que justifique tamanha apatia canarinha. Sinceramente só tirei uma foto, comprei dois postais e não entrei na tour de 10 euros pois: a lembrança era quase mórbida, teria que esperar uma hora e o sol já estava torrando o cérebro, além do valor supra citado. Vazei.

Cheguei no albergue junto com dois argentinos, logo o assunto era futebol, Carlito Tévez, Seleções, enquanto na TV a Austrália fez três gols em poucos minutos e virou o marcador para 3x1 contra os nipônicos. Ê Zico zica! Feito check in, atravessei a rua, descolei uma refeição que tinha arroz esquisito e República Tcheca 3x0 Estados Unidos. De volta ao albergue, puxei papo com um argelino que explicava que o bairro onde estávamos (Clichy) era reduto argelino, mas que tinha que ter muitos “papéis” para conseguir permanência em solo francês. Depois tomei parte numa conversa de dois americanos, contrariando o escurinho que não acreditava na Seleção verde-e-amarela e demonstrava conhecimento de táticas: ele, Ben, joga futebol profissional e inclusive estava na Europa para testes, porém, teria que voltar, pois tudo estava parado devido à Copa do Mundo.

Era quase 21h, o dia ainda estava claro e descemos pra ver a estréia da Seleção da Pizza e da Macorranada contra os africanos de Gana: 2x0 Itália, mas é porque os adversários ainda são muito ingênuos na defesa e perderam muitos gols. Sugeri para o Ben, pós primeiro tempo, irmos ao centro, nos arredores da Torre Eiffel. Aceito. No metrô, em propaganda, Ronaldinho Gaúcho vendia café. Fora, a Torre sempre me impressiona por tamanho, forma e luz. Me ilumina e continua sendo o monumento preferido, de amor à primeira vista. Dessa vez, Ben chamou-me atenção para um fenômeno de banho de luz, como se fosse uma grande árvore de Natal, irradiando seu brilhante pisca-pisca. Fotos e filmagens deram uma pequena noção do showzinho. A amiga Giovanna, na véspera me lembrou que chegaria no dia dos namorados. “E você em Paris, hein Zé?”, brincou Gi, porém, faltou uma cia feminina. Dizer que estava com o simpático Ben será motivo de troça dos amigos que adoram me zuar. Na área da Torre comprei dezenas de mini-torres pra presente e uma grande, com botão de acender. Essa vai iluminar minha estante do quarto.

A volta foi um sarro: terceira vez aqui e ainda não me liguei que não se deve jogar o bilhete do metrô fora, sim usá-los pra sair de um embarque para outro, ou baldeação. Por isso a cada catraca que encontrávamos tínhamos que pulá-las... e foram várias. Se algum guarda nos parasse iríamos ver se francês iria engolir explicação em inglês... No albergue por volta de 1h, a notícia ruim do dia: meu vôo Orly – Berlim saía 6h30, cedíssimo e, para meu espanto e despreparo, as conduções da cidade só começariam a funcionar às 5h30 e é um tanto distante. Ou seja, táxi. Já os odeio em reais, em euros eu choro. Mas pago. Tive que pagar, pois não haveria outra alternativa. Dormi insuficientes três horas acordado pelo despertador do celular, às 4h30. Combinei o táxi, por volta de 40 Euros. O motorista não falava inglês, mas mostrou no digital do taxímetro o valor da facada. Olho no nascer-do-sol com taxímetro distraía meu caminho, num percurso de 30 minutos. Au revoir, Paris.