segunda-feira, 13 de julho de 2009

Meu Dicionário Gaúcho de A a Z

Nove meses entre os gaúchos e finalmente se deu a gestação do texto comparando as diferenças entre os idiomas paulistês e gauchês, também temperado com termos típicos e freqüentes do mais “estrangeiro” dos estados do Brasil: o Rio Grande do Sul.

O dicionário está distribuído em mais de uma centena de verbetes de A a Z. E para o inferno as letras gringas “k”, “y” e “w”. Só se fabricasse para listá-las aqui.

O assunto rende, afinal de contas, debater regionalismos e sotaques é sempre um tema delicioso quando duas ou mais culturas interagem.

Além dos comparativos, muitas vezes, a definição da expressão funcionará como pano de fundo de muitas histórias relevantes e irrelevantes também. Portanto, não se importem se fugir do verbete em questão.

É gaúcho, mas bem poderia ser sulista, já que, devido ao seu poderio na região, influencia os vizinhos da região, Santa Catarina e, em menor intensidade, Paraná.

São frutos de pesquisas na net, com os gaúchos de casa onde moro, da loja da TAM no aeroporto Salgado Filho e da rua, até por ter uma quilometragem considerável para ir e vir do trabalho – de três e quatro horas por dia, 23 dias por mês, entre trem e ônibus –, acabo ouvindo muitos jovens se comunicando...

O guia tanto servirá para o paulista (ou sendo mais abrangente, região sudeste) no Sul como vice-versa, para evitar fiascos. Toca ficha, como manda o bom gaudério.

A

Acoar – Verbo, o mesmo que “latir”. O cachorro acoa aqui. Logo o Tóbi é o cão acoador da casa. É a minha palavra preferida para torrar o saco da Gabriela, minha noiva.

Alcançar – Outro verbo. Exemplo, “me alcança a calculadora?” Equivalente a “me passa isso”, “me dá” ou “empresta”. Adotei a expressão na loja. Esse é um dos termos em que vale o provérbio “em Roma faça como os romanos” .

Alaminuta – Popularíssimo PF, ou prato feito.

Apavorada – Empregada de uma forma até irônica. “Tal pessoa ficou ‘apavorada’”, num sentido de “chocada”. Similarmente em São Paulo traduziria como “passada”. A listei depois de cansar de ouvir minha noiva usá-la.

Arroio – Córrego.

Atílio – Resolveram dar um nome próprio ao “elástico” para prender dinheiro em banco.
Atucanado – Adjetivo para designar que o cidadão está “encanado”, “preocupado” com algo ou mesmo “ocupado”.

B

Bah – Interjeição para tudo. Mas bah! Um amigo japa em visita ao Rio Grande disse que um gaúcho falou 10 bahs de 15 palavras. Desconte o exagero, mas é extremamente massificado seu uso. É hilário quando a Camila da loja começa contar algum babado com um “bah, gurias...”. As gírias da gurizada criam variações como “bã”.

Barbada – Mesmo significado. Destaca-se pela grande quantidade de vezes em que é usado. “Vou te dar a barbada” ou “esse preço está barbada”. Raro passar um dia sem ouvir essa.

Barbaridade – O bah completo, interjeição cinco estrelas em tradição. Esse faço questão de usar com a Kelli, da loja, em ironia, sobre algum fato. “Mas que barbaridade!”

Bauru – Na Praça da Sé, é um misto quente (pão francês, queijo e presunto) com tomate, prensado. Já em Porto, é totalmente outro: cacetinho cervejinha (explicação na letra “c”), bife. Ou seja, o “americano”.

Bento Gonçalves – Grande líder da Revolução Farroupilha (1788-1847) que por um triz não fez da província do Rio Grande do Sul um país. Ver Casa das Sete Mulheres. Eu vi no youtube (http://www.youtube.com/watch?v=yurEgp6GtCY), capítulo (de dez minutos) por capítulo, para entender esse povo da qual já faço parte. Hoje é nome de cidade e se não houver rua BG em alguma cidade, definitivamente essa cidade não é no Rio Grande.

Bergamota – Nossa “mexerica”. Em outros lugares “tangerina”. Fruta engraçada e de cheiro meio desagradável. Lembro de uma amiga que levava essa fruta de nome exótica para o trabalho e a apelidei de mexerica. A “berga” tem sonoridade estranha, talvez pela rima com marmota, algo gordo e desajeitado.

Bobice – Igual a “bobeira”.

Bombacha – Calça larga dos gaúchos com detalhes (favos) nos lados. Traje tradicional do gaúcho. Não é tão frequente na capital, sendo mais usada no interior do estado. Na Argentina é a íntima e feminina calcinha. Não que esteja dizendo que o gaudério use calcinha – longe de mim –, apenas fazendo uma tradução literal...

Botar fora – Troque o “botar” por “jogar”.

Bração – Ai sim a diferença é 100%. Enquanto na Terra da Garoa o condutor “bração” é lamentável de volante, o daqui tem uma perfomance digna de piloto de fórmula 1.

Brigadiano – Os homens da lei do RS, “polícia”, que integram a brigada militar do estado.

Brim – “Calça jeans”.

Bruxo – Nas idas e vindas do trabalho, descobri por osmose que bruxo seja uma gíria gaúcha que corresponda ao “maluco” paulista.

C

Cacetinho – Nome duvidoso do “pão francês”. Por isso ao ir na padaria Pisagri de Novo Hamburgo, peço por pãezinhos e indico incisivamente para não pairar dúvidas.

Cacetinho cervejinha – Com farelos por cima, genérico do pão sovado, ou vice-versa, para não me acusarem de bairrista, rs.

Cadeira – Não, não é para sentar, seu (sua) folgado (a)! É sim para estudar, a definição corrente destas plagas remete à determinada disciplina que se estuda na universidade.

Café colonial – Café é um eufemismo. No cardápio, tábua de frios, salgados, doces, e para beber, além de café com leite e chocolate quente, suco de uva e vinhos. A refeição ganha status de almoço ao servirem frango a passarinho – uma verdadeira orgia gastronômica!

Cantar – É lugar comum no Brasil inteiro, o povo do sul canta ao se expressar como nenhum outro.

Carrinho de lomba – Carrinho de rolemã.

Capaz – Interjeição de aprovação ou desaprovação muito utilizada – a gauchada não fica três minutos sem falar, capaz que não. O sinônimo do resto do país é “magina” ou “até parece”.

Charque – O aumento por parte do Império dos impostos da “carne seca” detonou a guerra de quase dez anos entre farrapos e imperiais.

Chavear – Rolou um neologismo neste verbete, ao invés de fechar a porta com chave – óbvio –, chaveia-se.

Chimarrão – O chimarrão está para gaúcho assim como Romeu para Julieta. Par inseparável que faz parte da foto do Rio Grande, seja em casa ou no trabalho, de noite e de dia, acreditem, até no sol a pino com praia. Pretexto para encontros, enquanto que fora do RS se serve um cafezinho. Composto da cuia – digo, o recipiente –, a bomba metálica – o ferrinho para puxar o liquido quente –, e claro, o mate. O celebre escritor gaúcho, Luíz Fernando Veríssimo dimensiona bem a importância do chimas, fazendo analogia com outro ícone dos pampas: “Tirar chimarrão de gaúcho é o mesmo que xingar a mãe e Bento Gonçalves juntos.”

Chimia – Geléia.

China – É um apelido que pode ser um tanto pejorativo que vem das épocas da Guerra dos Farrapos, quando mulheres acompanhavam os soldados e, nesses tempos difíceis de revolução, os ajudavam a descarregar a tensão. Há quem use de uma forma mais carinhosa. Encontrei na Internet o seguinte depoimento: “É um tremendo erro pensar que china era prostituta, pois é só uma forma de denominar a mulher. Dizer que as chinas acompanhavam os farrapos é o mesmo que dizer que mulheres seguiam a tropa. China Véia ou Chinoca só quer dizer mulher idosa e são só expressões.”

Churrasco – Só exponho aos gaúchos da gema – como os primos Marlon & Gabi – que estufam o peito e propagandeiam que é o melhor do Brasil: “Olha, não sei se é melhor, para mim é diferente – para vocês é uma refeição de todo santo domingo, com mesa, arroz e tudo mais como reza a tradição. Diferente do churrasco nacional, onde se celebra um evento, pode ser um aniversário, uma despedida, uma reunião qualquer de trabalho, família ou amigos.”

Coisarada – Seria um “etc” ou “um monte de coisas”.

Coisa séria – Reação de indignação a algo, bem corriqueira no vocabulário gaúcho.

Colono – Vivem em colônias, no meio da serra ou no interiorzão perto da fronteira com Argentina e Uruguai. Como são do campo têm costumes simples. Muitos usam como um adjetivo de uma forma pejorativa, subentendendo que todo colono é rude.

Cordão – O meio fio da calçada, como atesta esse texto publicado no jornal gaúcho Zero Hora: “A calçada é estreita, e os carros ocupam quase toda a largura da mesma, sobrando apenas ao redor de 30 centímetros entre a traseira dos carros e o ‘cordão’ da calçada, um espaço insuficiente para passar.”

CTG – Centro de Tradição Gaúcha. Todos esses termos, com tradição no mesmo lugar. E põe lugar nisso, em todo o território e além, até nos Estados Unidos. Mais de 1400 catalogados! Para formar um CTG bastam quatro famílias que estejam dispostos a manter vivas as tradições gaúchas de churrasco, chimarrão, música, trajes típicos etc. Vê se tem similares paulistas, mineiros, cariocas ou baianos? Outra informação para entender bem do que se trata o “gauchismo”, um forte sentimento de nacionalismo é a bandeira do estado. Em nenhum outro estado do território brasileiro se expõe tanto a bandeira como a das cores verde, vermelha e amarela. Presente em empresas, anúncios, jogos de futebol etc.

Cuca – Antes de vir para cá só conhecia a do Sítio do Pica-pau Amarelo. Além, claro, de nossa cabeça pensante, de onde se cunha a expressão “cuca fresca”. No meio do futebol é o ex-jogador do Grêmio, entre outros times, e hoje técnico do Flamengo. Nada disso, é um “pão doce”, presença freqüente nos cafés-da-manhã dos pampas.

Cueca virada – Uma “rosca doce”. Misto de sonho e bolinho de chuva com esse nome jocoso. Também chamada de “calça virada”.

Cuidar – Notabiliza-se pela economia de uma palavra. Enquanto empregamos verbo + substantivo, “tomar cuidado” com algo. No Sul somente o verbo resolve, exemplo: “cuida para não fazer isso”.

Cusco – Cachorro.

D

De – É famoso em todo país o “leitê quentê dá dor de dente” dos paranaenses, com o “e” pronunciado da maneira como deve ser, não distorcido – com som de “i” – como boa parte dos brasileiros praticam. D“I” manhã, carne d“I” gado etc. Curioso é que a forma correta de se pronunciar soa bastante estranha aos ouvidos de quem se viciou a falar e ouvir equivocadamente.

De cara – Pode ser muito puto com deteminado assunto ou pessoa, ou ainda estupefato.
De vereda – Imediatamente, de momento, de uma vez.

Deu pra ti – Essa é trilha sonora da cidade de Porto Alegre, quiçá do estado. O verbo dar – ao contrário do que, maliciosamente, você (ou tu) pensa – é finalizou-se. Exemplo: na loja alguém vai passar um cartão de crédito na máquina do outro. Terminou, avisa com um “deu”. No clássico da dupla gaúcha Kleiton & Kledir, o trecho “deu pra ti, baixo astral” sentencia que “chega de baixo astral”. Dai completam o refrão com “vou pra Porto Alegre, bah, tri-legal...” Música mais gaúcha, impossível.

E

Encarangado – De frio!, brubrubru. Eu que o diga no primeiro inverno sul-riograndense. Aqui pinguim anda encarangado, com luvas, cachecol e solta fumacinhas pelo bico.

Estar de – Dia 16 de junho último eu “estava de aniversário”, não “fazia aniversário” como celebram meus conterrâneos.

Embuchar – Pode ter a conotação de alguma guria ficar grávida, e especificamente, outra versão, essa à mesa, quando fulano ou siclano resolve falar groselhas e abobrinhas, beltrano manda um “se embucha aí com seu feijão e cala a boca...”

Empenhado – Ficar na mão. Exatamente como eu e os irmãos Thiago e Gabriel ficamos no dia dois de julho, após o Timão ter conquistado o tri-campeonato da Copa do Brasil sobre o badalado Internacional, em pleno Beira-Rio lotado, o carro “sogro-movel” morreu na freeway (via de acesso ao aeroporto de Poa e que também liga o estado a Santa Catarina) às três da matina. Foram quase duas horas de frio, desespero e impotência até o guincho nos levar até a BR 116. Daí foi outro problema...

Estrovar – Mineiro também usa, vem de “estorvar” que significa algum empecilho, dificuldades. Porém, no popular de MG e RS o verbo se tornou estrovar.

F

Faceiro – Quem está faceiro está de bem com a vida, alegre. Um dos adjetivos prediletos desse povo.

Faixa – A avenida principal.

Faixa nobre – É o primo gaúcho da zona azul paulistana.

Fandango – Nos meus tempos de Sampa conhecia por salgadinho da Elma Chips. Em Poa aprendi que é um conjunto de danças ou baile local que compõe a rica tradição gaúcha. Quem nunca escutou o clássico do Gaúcho da Fronteira, “churrasco e bom chimarrão, fandango, trago e mulher. É disso que o velho gosta, é isso que o velho quer”?
Fatiota – Terno.

Feito – Outra palavrinha que se destaca pelo exaustivo uso. Tem várias denominações, vai de um “pronto”, “combinado” até um uma interjeição de alegria e júbilo, um “valeu”. Um exemplo: na hora do jogo da seleção, o zagueiro faz um gol de cabeça ou o artilheiro faz um gol estilo peidinho de veia (chute fraquinho)... tanto faz... saiu o gol. A torcida emana um “Feitooooo!!!” Quem criou “feito!” foi um narrador de futebol da RBS TV, Paulo Britto.
Funda – Estilingue.

Fiasco – Muito usual. E quem apronta muitas “mancadas” ou “gafes” recebe o troféu de fiasquento.

Finar – Se finar de rir é “morrer de rir”.

Folgar – O verbo por aqui é usado com a mesma conotação de “zuar”. Um exemplo bem real: às três da manhã tocou o celular do colorado Marlon. O Corinthians havia acabado de ganhar o título sobre seu time. Batata, ele imaginou: “A essa hora o Zé quer me folgar...” Na verdade, como exposto verbetes acima, estava empenhado.

Fora da casinha – Lelé da cuca, pinéo, doido de pedra etc. Nada parecido com o que vos escreve.

Fragar – Se dar conta de algo. Consta em um site que pesquisei que é derivado de “flagra”. De fragar deriva-se o sifragol, um dispositivo que só os dotados de bom-senso possuem, assim como os paulistas conhecem o “simancol”.

Furão – Tanto pode ser o sentido que se usa em esse-pê: já combinado, o cidadão não vai e fura. Como também ir a um evento sem ter o prévio convite. O que no centro do país se dá o nome de “bicão”, ainda que o sentido no RS seja o mesmo também.

G

Gá-bi – Derivado de Gabriela. Coisa óbvia. Nada óbvio é a forma de acentuar Gá-bi, isso, com acento na primeira sílaba. A Gábi gaúcha é diferente da paulista, Ga-bí, essa oxítona. Diferenças...

Gaita – O “Rei do Baião” Luiz Gonzaga tocaria gaita se fosse gaúcho. Como é pernambucano tocou – muito bem, diga-se de passagem – “sanfona” até morrer. No resto do país gaita é um instrumento que se toca com a boca chamado no Sul, portanto, de gaita de boca.

Gaudério – Ao pé da letra é “pessoa que não tem ocupação séria e vive à custa dos outros, andando de casa em casa”, mas tem um significado mais amplo no RS, aliás, virou sinônimo desse povo.

Galinha – O sabor da carne é o mesmo, só que num restaurante da Redenção vou pedir galinha e na zê-ele paulistana pedirei um “frango”.

Ganhar – Na interpretação que tinha notícia, esse verbo tinha uma conotação positiva, ganhar na loteria, ganhar um jogo etc. No Sul não, ou será que ganhar um treco, multa, enfarte ou atestado médico é bacana? Em tempo, falamos “ter um treco”, “ter um enfarte” e “levar multa”.

Goleira – As “traves do futebol”. Muitos, os mais antigos como meu sogro, falam “golo”, assim como em Portugal, para comemorar o momento máximo do futebol.

Gringo – Popular na região de Caxias do Sul, cheia de imigrantes italianos. Um gringo famoso é o técnico pentacampeão Luiz Felipe Scollari.

Guampa – São os chifres do boi, daí até ser gentil com um amigo chamando-no de guampudo, “chifrudo”, é dois palitos.

Guria – Graças a minha amada guria estou no Sul e, portanto, esse texto existe. Dispensa definição. E eu sou o gurizinho dela, que meigo e I love her, minha “mina”, e eu sou o “mano” dela, tá ligado!

H

Hora do pique – Hora do rush, em que todos vão para o trabalho ou voltam. Que em outras partes é “horário de pico”.

I

Incomodar – Sem mudanças de definição, o que percebo é a freqüência e até neologismos, ou “sul-logismos”. Ontem mesmo um passageiro chiou na loja. “Não quero ‘incomodação’ com esse bilhete.”
Ir aos pés – Forma polida de dizer ir ao banheiro fazer o número 2. Muito usado nos médicos, afinal não fica bem para o doutor perguntar se você tem cagado ultimamente.

J

Jogar – “Apostar”. Jogo contigo que não sabia dessa, paulista...

L

Lancheria – Lanchonete.

Lomba – Aclive ou declive dependendo do ponto de vista. Para facilitar, ladeira, subida.

M

Magrão – Outra gíria jovem, que, aliás, significa “malandro” de uma forma amiga. Tinha um motorista que me chamava de assim, desconfiei ser em virtude da minha forma “chassi de grilo”, não era...

Marchar – No Rio Grande se te pedirem para marchar, não faça como um soldado, ponha a mão no bolso e pague!

Massa – Não que o “macarrão”, prato preferido nas mesas paulistas de todo santo domingo, não seja massa, mas é que no Sul não se fala macarrão ou macarronada, somente massa.

Mijada – É só fazer coisa errada no trabalho e levar aquela “comida de rabo”, mijada aqui no Sul.

Mumu – Doce de leite com açúcar, serve de recheio para bolo, churros etc.

N

Nóia – Apelido da cidade e do time de Novo Hamburgo. Nada que ver com a gíria derivada de paranóia, para drogados. A alcunha Nóia vem da tradução do nome em alemão, aliás essa cidade que junto com São Leopoldo, Campo e outras menores compõe o Vale do Sino, de fortíssima presença de imigrantes germânicos.

Negrinho – Comi vários no meu aniversário. Opa, não é isso que pensam!? São ingênuos e doces brigadeiros.

O

Olhar – Usam esse verbo para “assistir” ou “ver” tevê ou cinema, tipo “olhou o jogo, filme etc?”

P

Pampa – Terra, de preferência uma planície vasta para se criar gado. Um dos apelidos do estado, quem nunca ouviu chamarem o Grêmio por “Tricolor dos Pampas”?

Pampa-sáfari – Simba-sáfari.

Parada – Ponto de ônibus.

Parcão – E paradão, postão. Tudo “ão” para parque, terminal de ônibus e posto de saúde.

Pardal – O dedo-duro que em SP se convencionou chamar de “radar” para os apressadinhos no veículo de plantão. Caneta eletrônica e com foto. Depois é só pagar as multas, sem contar os pontos na carteira.

Pátio – A diferença aqui começa na definição, em Sampa ao redor da casa temos um “quintal” não pátio, que, aliás, para mim é salão principal do primário e ginásio. Outra diferença, essa não de significado, notada pela Gabi, é que em São Paulo inexistem os pátios enormes, com gramados, como em Novo Hamburgo, por exemplo.

Pelego – Outro dia fui ao barbeiro e ele perguntou se eu queria aparar o pelego. Deduzi que se referia ao “cabelo”. E era. Pelego é o pêlo da ovelha, daí a expressão. Essa palavra, na gíria sindical, é de alguém muito do puxa-saco.

Piá – Guri menor. Também peru.

Pinica – Além do sentido que consta no Pai Aurélio, “irritar a pele (se diz de roupas ou de grama, por exemplo)”, significa aquele jogo de infância, “bolinha de gude”.

Pila – Enquanto outras partes do país se refere à moeda Real, como 100 “paus”, “cruzeiros”, “mangos”, “contos”, nos pampas é só “pila”, moeda local caso fosse proclamado independente. A razão segundo “História de Rio Grande do Sul para jovens” de Roberto Fonseca, é que o político Raul Pila teve os direitos políticos cassados por Getúlio Vargas e sua trupe no inicio do século passado, como todo bom gaúcho, foi se exilar no Uruguai. Amigos de Pila arrecadaram bônus, denominados “pila”, para sustentá-lo. E pila ficou até hoje. Outro detalhe observado, assim como na Argentina, entre a moeda e os centavos fala-se “com”,explico: R$10,20, se diz “dez ‘com’ vinte”.

Pilchado – Roupas tradicionais do gaúcho. Para o homem, bombacha, lenço, espora, guaiaca (espécie de cinto), facão e de cavalo. A mulher vai de prenda, justamente o verbete vizinho de baixo.

Prenda – A mulher gaúcha. Exemplo: Gabi é minha prenda. Na semana farroupilha há a tradição das gurias se vestirem de prenda, vestido bordado e rodado, ou saia e blusa, variando de acordo com a idade e estação climática. Na minha terra prenda são os mantimentos que são doados para alguma instituição. Sobre a atual fase do Internacional – de ter enfiado 8 gols nos pobres caxienses em finais de campeonato gaúcho, Juventude e Caxias, em 2008 e 09 –, outra Gabi, essa da loja, desdenhou: “São prendas. Só gostam de Gauchão...”

Puxar – Se usa para “pegar” alimentos da panela.

Q

Quebra-mola –
Lombada.

Querência – Lugar onde alguém nasceu, se criou ou se acostumou a viver, e ao qual procura voltar quando dele afastado. Exatamente o que sinto em relação à Paulicéia Desvairada.

Querido – Significado óbvio, outro que está aqui pela insistência com que se usa esse adjetivo no cotidiano, tipo “tal pessoa é bem querida”. Outro dia reparei na Silvana, supervisora da loja, elogiando um passageiro: “Como é querido o seu Renato [Marsiglia].” Esse mesmo, o ex-juiz e atual comentarista da Rede Globo, que faz questão de cumprimentar atendente por atendente na loja.

R

Rabicó –
Presilha para prender cabelo, carinhosamente chamada de “piranha” em SP.

Rancho – Devo salientar que é bem dolorido, refiro-me a compra do mês mensal.

Recém – Idêntica definição, porém, em Diadema (Grande SP) diria “ele ‘acabou’ de chegar.” Ao passo que em Novo Hamburgo, “ele ‘recém’ chegou.”

Render – Tipo você está fazendo uma função e tem que abandona-la, daí você pede para alguém te render, ou “cobrir”, “substituir”.

ResBalar – Essa palavra está marcada porque despertou uma guerra civil no quarto dos Reis Costa, explico: divagava sobre o chá de macela, (a Gabi conhecia por “marcela”), uma outra palavra que não lembro e o pomo da discórdia, resvalar, resvalou na conversa. Já havia ouvido a cunhadinha Luana dizer “resbalar”, então disse à Gabi tranquilamente, meio joselito – sem noção – “por que vocês insistem em falar errado algumas palavras...” pronto, ela se armou e soltou petardos, “ah, só vocês que falam certo!” Depois que a poeira baixou e expus que não quis ofender, só entender. A explicação é até óbvia, vem da influência platina do espanhol (todo “v” é pronunciado com som de “b”) de argentinos e uruguaios.

Rótula – No joelho? Também, com a ressalva que no RS é a “rotatória” das ruas, avenidas e estradas.

S

Sair campeão – Em Buenos Aires cantei em La Bombonera “Boca va salir campeón”. Sem nunca imaginar que em Poa também conjugam esse verbo. Outra forma encontrada é “ficar campeão”. Mais uma herança linguistica dos parentes de Cristovam Colombo. Contraste com outros estados do território nacional, onde vale o shakesperiano “ser (ou não ser) campeão”.

Salsichão – Lingüiça.

Sapata – Além de ser a forma popular de uma mulher que sente atração por outra, é aquela brincadeira de meninas, “amarelinha”, que pulam em quadrados riscados com giz no chão. No Sul se diz tanto amarelinha quanto sapata.

Sapato – A diferença neste ponto se dá na tradição em casamentos – e isso muito me interessa. Nos casamentos paulistas se troca dinheiro dos convidados por um pedaço da gravata do noivo. Em cerimônias gaudérias enche-se o sapato do noivo. Em 5 de setembro vocês podem usar as duas culturas.

Sentar as patas – Ser grosso com alguém.

Serra Gaúcha – Vale o clichê: vir até o Rio Grande e não visitar Gramado e Canela é o mesmo que esquecer de ver o Papa em Roma. O turista encontrará ecoturismo, chocolates, compras, restaurantes, com tudo que a gastronomia serrana tem de melhor, e adicionados de friozinho romântico e, sobretudo, glamour.

Sinaleira – Assim como no Rio de Janeiro, farol também é sinaleira. Essa é uma palavra que tenho obrigação de dizer. Muitas vezes, tarde da noite, peço para o motorista do ônibus parar mais adiante. Para isso, digo “pode parar antes naquela ‘sinaleira’?” Porque até explicar que farol é sinaleira o busão passaria do ponto... ops, da parada.

T

Tampar – Até onde eu sabia só se tampava panela ou algum recipiente onde coubesse uma tampa. Como diria Sócrates “tudo sei que nada sei”, pois na terra de Getúlio Vargas o verbo nada mais é que cobrir alguém com lençol. Eu vivo destampando minha noiva.

Tchê – Símbolo forte do gauchismo, tchê. Assim como “meu” na maior metrópole brasileira.

Te – O pronome oblíquo “te” é vastamente pronunciado em terras gaudérias. Exemplo: “Te acalmas!”, “Não te preocupas” e até nos xingamentos da patroa: “Vai te cagar!”, Ai não, vai ser uma sujeira danada!

Tema – A Luana enrola um monte para fazer o dela, digo “lição de casa” escolar.

Ti – Substitui o “você”, por exemplo. “Vou preparar uma carne para TI comer.” Ou simplesmente “isso é para TI”. Tem um humorista que imitando o técnico Tite, do Inter, encena: “Te digo que isso é para ti, para tu e para o tatu.”

Tocar – Atirar algo em alguém. No futebol se algum time “tocou três”, quer dizer que “meteu” três gols no adversário.

Tocar ficha – Siga adiante, faça o que tem que ser feito. Segue o bonde.

Tocar flauta – Bem específico nas discussões entre torcedores de futebol, para tirar um sarro do perdedor. No momento minha flauta está apontada para os colorados.

Torrada – Misto quente.

Torta – O gosto da torta paulista é salgada. Já aqui, é a torta de aniversário, ou doce, nosso “bolo”.

Trancar – A BR 116 está constantemente trancada, com um grande fluxo de veiculos indo da serra e regiões metropolitanas para Porto Alegre e vice-versa. Inclusive lê-se em placas de trânsito: “Nunca tranque o cruzamento.” Além da ideia de engarrafamento e trânsito, trancar substituí “travar” o computador.

Trensurb – Trem, já que metrô só se for por debaixo da terra, de Poa e grande Poa. Em junho, duas semanas de greve, um absurdo! População na mão, recorrem a insuficientes ônibus hiper-lotados. Até o momento vai do centro, Estação Mercado até São Leopoldo, totalizando 17 estações. Mas estima-se que no máximo até fim de 2010 chegue em Novo Hamburgo, onde moro. E só porque o RS é sede da Copa do Mundo no Brasil, em 2014, e NH pleiteia ser sub-sede.

Tri – Mais um campeão de audiência quando se elogia ou quer dar intensidade a um adjetivo. Tri-legal, tri-massa, bem-tri... tri, tri e tri. Perpetuou-se devido a dois tris no futebol da década de 70: tri-mundial da Seleção Brasileira, em 1970, e tri-brasileiro dos colorados (75-76-79). Impossível perder o gancho de constatar que fomos tri da Copa do Brasil justo em Porto Alegre. Tri-legal!

Trovar – Jogar conversa fora. Serve também como “xaveco”, “tás trovando a guria?”

Tu – Você!, não você, leitor, mas o pronome pessoal do caso reto. Tu versus Você, que no Beira-Rio, mais que um Internacional x Corinthians, foi um Rio Grande Sul x São Paulo. 0 x 2 no placar, por cima da divisão entre torcidas, o corintiano Gabriel provocou o colorado: “VOCÊ quer que eu compre um faixa de campeão para vocês?” A resposta foi regional, não esportiva: “Você é o caralho, é TU....”

U

- 0 -

V

Vinte de Setembro – Data histórica que estourou a Revolução dos Farrapos no ano de 1835. Anualmente nessa data se dá os festejos da “Semana Farroupilha”.

Vileiros – Favelados. Pessoas simples vindo das vilas. Ser chamado de “vileiro” é pejorativo. A Gabi mesmo vive me chamando deste jeito só porque torço pelo Corinthians. Ela não sabe o que é ser feliz... risos. Vai Corinthians!

X

Xarope –
Idêntica a maneira de criticar determinada pessoa por xarope, porém, no Sul situações são xaropes igualmente, num sentido de “complicado” e “ruim”. Além de ser comum o neologismo do verbo xarope, “o juis ‘xaropeou’ o jogo.”

Xerox – Aqui você bate um xerox ao invés de “se tirar” uma cópia.

Z

Zero Oitocentos –
Diz o Marlon – e só o Marlon – que se você vai a um evento no 0800, na “faixa” em SP, ou grátis. Está aqui para não deixar a letra “z” zerada.

sábado, 19 de janeiro de 2008

Fut-Barça

De domingos ao meio-dia pode faltar macarrão, frango e coca-cola, mas futebol não. É sagrado. Sacrifica-se a balada, o almoço do meio-dia, a namorada, mas bola, na-ni-na-NÃO! Ainda mais que a quadra tem o refresco de ser coberta para dias de sol & chuva. Abaixo relatos dos principais peladeiros...

Dudu Love - Love porque seu nome no MSN está entre vermelhos coraçõezinhos. Uma dupla sertaneja cantaria “é o amor”. Pode ser, mas que é bicha, é. Antes do jogo começar, distribuí as camisetas para separar os times. Ás vezes rola polêmicas com a Família Derose. Segundo o Thiago, sempre quer mudar as regras. Ao campo, enfim... Estilo CDF, aplicado, veloz, marcador, incansável. Chega a ser chato na marcação. Quando penso que estou prestes a fazer o gol, aparece o Playmobil da Gimba do nada e trava a bola tirando o doce da boca da criança. Outro dia perguntei porque que ele gostava tanto de me marcar. Ele: “Alguém tem que fazer isso.” Não é muito chegado a carregar a bola e fazer gols, prefere passar a bola.

Taka - No meu inicio bati boca com ele porque - que injustiça - não lhe passei a bola?! Recentemente levei um chute de bico no meu escutador de bolero. Fiquei uma semana com sensação de cerração e desconfio que até hoje não escuto direito. Acho que o Japa não vai com minha cara. Rs. Dentro de campo, desde que jogo aqui é o que mais evoluiu. O Peter concordou. Vem fazendo muitos gols, alguns, bonitos. É imprevisível. Muitos de cabeça, também, maior caixa d'água craniana! No gol já operou vários milagres.

Adriano - O tesoureiro. Trabalho duro cobrar a galera, mandar mails avisando do pagamento. Mas tem compensações: não perde um fim-de-semana, viaja todos sem exceção! A ala sensacionalista especula que role um caixa II. Nos dois churrascos que teve mostrou que manja em lidar com carnes. Também auxilia o Dudu na divisão dos coletes. E futebol? Tantas atribuições assim não sobra tempo pra jogar, ou quando não viaja, se cansa do mesmo drible - estilo ciscador - e assume a forma de "xícara" com as mãos na cadeira.

Danilo - Também viaja em todos os fim-de-semanas com o Adriano. As más línguas sugerem que o papo de cunhado é migué... Bola rolando, não tem intimidades com a redonda. Passe e chute, só de bico sem nenhuma classe. Bom cabeceador, seu negócio é a marcação. Vez ou outra cisma de marcar-me homem a homem, percebo pela sua respiração ofegante ou quando recebo falta, parece um tanque desgovernado. Pós jogo bate um bolão na mesa tomando brejas com a galera. Gente Fina.

Adriano Loco - Esse não tem freio. Traça uma linha reta e vai a toda velocidade... Às vezes chega na cara do gol, e faz o gol. De bico, sempre. Outras, tromba com quem estiver na frente. É imprudente sem ser violento. Falta noção quando, por exemplo, não levanta a cabeça e olha para o companheiro livre (ó quem fala!). Só funciona na base de alguém orientando, quando jogo na mesma equipe lhe digo a quem marcar. Terminado o jogo é caladão, discreto.

Marrom - Sem ele não haveria esse texto, pois foi ele quem me apresentou essa galera. Um dos meus grandes amigos da TAM. Figuraça. Desconfio que comsumirá mais linhas de comentários. A eles: impossível passar um jogo sem suas atrapalhadas por, falta de noção ou técnica mesmo. As populares “marronzadas domenicais” que tanto nos faz rir. Faltas imprudentes: dele recebi a falta mais violenta da minha carreira, um carrinho por trás que fosse eu o infrator, me auto-aplicaria um cartão vermelho e sairia de quadra. Outro dia tacou a bola no Adriano com a mão por tacar, feito criança. "Ah, deu vontade!", justificou. Ultimamente anda muito cobrado por sua falta de competitividade. O jogo pegando e ele querendo fazer gracinhas, chamei na chincha no intervalo. Vez ou outra protagoniza jogadas brilhantes, cagadas mesmo, porque quando resolva armar o jogo leva seus colegas de time ao desespero com passes errados. É um brasileiro que ama futebol e Corinthians, botonismo e Fê e não desiste nunca!

Sonic - Grande “amigo” do Rica. Um mala que se atira no chão por prazer, um ator. Firuleiro pra caramba, adora dar rolinhos, chapéus e rir sarcasticamente. Principalmente de mim. É inegável sua habilidade ao driblar com suas pernas de seriema. Também finaliza muito bem. Irrita quando quer chutar todas as bolas antes do meio campo. Acertou três de mil tentativas. Outra qualidade sua é o jogo aéreo, imarcável em escanteios. Na divisão de times é ele dum lado, eu do outro. Até porque seriam necessárias três bolas. Quando jogamos juntos, até tentei, mas não conseguimos fazer muitas tabelas. Ah, fez o gol de bicicleta que tanto prometi e ainda não fiz.

Peter - Dentista, palmeirense e ótimo goleiro, o Rogeiro Ceni da Kenedy. Sempre é um desafio vazá-lo. Valoriza muito também, tem bolas chutadas no cantinho ou no ângulo em que ele voa e diz que tocou só pra ficar com a fama de "putz defesassa!!!" Outra mania dele é sempre parar o jogo alegando cisco no olho, dor nas costas etc, todos sabem que é manha. O papagaio. Só ele pára o jogo pra dar conselhos de táticas e, pasmém, pro adversário. Meu sobrinho China mandou um balaço do meio campo e gritou, “valeu Peter por pedir pra eu chutar de longe”. No inicio enchia o saco pedindo pra esperarmos a bola baixar pra chutar de primeira. Não se contenta em ser goleiro e técnico, não raro abandona o gol e sai pra armar o jogo. Certa feita, rolou um puta estresse: ele não me passou a bola, saiu jogando e eu parei na jogada, indignado. Resultado, perdemos a bola, tomamos o gol e ele, revoltado comigo, abandonou o campo batendo o portão.

Thiago - Sua arma mortal, quando acerta, é um tiro fortíssimo sem tomar distância. Que já vi só ele tem esse dom. Um “atleta” azarado, sempre se contunde. Começa o jogo e na primeira jogada põe a mão na coxa, faz careta e diz “aí, porra, não vai dar”. Tipo aqueles migué do Romário. Reclamão pra cacete, um verdadeiro Doutor Pimpolho, ah vá se fudér?*#! “Mas eu tou melhorando...”, sempre diz. Médio... Antes de ir pra verdadeira Barcelona, quebrei uns paus com ele: lhe coloco na cara do gol (fato raro) e ele ainda diz “passa a bola rasteira, porra!” Cuzão também, a gente precisando de mensalistas e ele abandona o barco. Sentimos falta dos trinta contos e não do seu futebol...rs.

Gabriel – Só ele e o Adriano Loco entram em quadra de óculos. Mais esquentado que o irmão. Ficou invocado porque fiz inocentes embaixadas. Na sua última aparição não concordou com as regras do Dudu de divisão de time, fez bico e foi embora deixando o Sonic sem carona. Erra os passes porque ora põe força demais, ora de menos, segundo fontes consultadas. Sempre joga na defesa e no gol, agarra bem.

Sérgio – Pra defini-lo vou usar uma declaração sua, pós um jogo, em Boludos Aires, em que ganhamos dos argentinos por impiedosos 13x4, em novembro de 2005. Na época disse: “Num jogo de 13 gols e não faço nenhum, não mereço mais que uma nota 6...” Dois pontos: primeiro, sua nota média, dada pelos outros jogadores do clássico sul-americano, foi de 7,2, ou seja, futebol é mais que gols, no caso dele é um jogador útil para equipe, tático que, esse é o segundo ponto, faz poucos gols mesmo. Um que fez foi decisivo e surpreendente: jogo disputadíssimo, escanteio cobrado com as mãos, ele se antecipa feito um foguete e marca de cabeça (!?). Ele e seu metro e meio. Também adora criticar o excesso individualista do primo. “Você não joga pro time”, acusou.

Rafa – O melhor marcador que já joguei contra. Páreo duro passar pelo primo do Thiago. Forte, preciso na antecipação e sem cometer faltas. Todas as vezes que já antevejo uma disputa de bola já penso como driblá-lo, mas raramente com sucesso. Saindo pro jogo faz vários gols fazendo uso de um chute potente. Numa roda de fim de jogo foi cantado pelo Peter, que pediu seu celular sob o pretexto de “minha prima tá sem namorado, acho que ela ia gostar de você.” Sinistro.

Cesinha – Casou então se tornou figurinha difícil. O palmeirense joga na defesa. Se cansa e machuca fácil. Num fim de um jogo o sacaniei: ele ia marcar o gol, dei um pique aceleradíssimo e lhe tirei a bola. Sem chutar a bola, chutou meu pé e machucou o dedo. Até hoje ele me chama de maldito. “Porra, seu Madruga, deixa-me fazer um golzinho só...” Fofoca do Sonic: “Todo jogo dou um rolinho nele.”

Zé – Em terceira pessoa é foda, vamos lá com algumas passagens. É unânime, prende muita a bola e chuta quase todas irritando os companheiros. Ás vezes se sente injustiçado: “Num jogo em que de 13, 14 gols, faço 9 ainda sou criticado. É demais!” Dudu comenta que se desse um drible e batesse no gol imediatamente faria mais gols, mas sempre insiste num drible a mais. Aos 33 anos – e meio – tem como principal qualidade a velocidade. Outra particularidade é marcar gols e anunciá-los aos gritos histéricos de “golaçoooooo”!!! Para 2008 a promessa é correr menos e passar mais.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Berlim: do you still need a ticket

Easyjet, ABCDs, maçãs energéticas, aquela piscada, Muro de Berlim, Gordon W, ingresso premiado, estréia na Copa, tor!, promessa, a “era do suco”, croatas, scheißes e muito mais

Dia 13 – terça-feira [ ] No aeroporto francês de Orly (ao sul de Paris) já encontrei animados Brazucas prestes a embarcar no air-bus da Easyjet. Recordo de um grupo de pernambucanos e um carioca com quem sentei ao lado. Em duas fotos registrei a descontração pré-Copa. Primeiro vôo low fare (baixo custo) que fiz, fiquei mal acostumado com a TAM, aqui não tem reserva de assento, quem chegar primeiro, senta. E sobre refeições, tem menu pra escolher. E pagar, lógico. Mas dependendo do preço que se paga no bilhete, compensa.

Primeiro desafio alemão: achar o albergue do amigo Thiago. Por meio de torpedos e ligações fui chegando no Heart of Gold, só não fiz reserva antecipada, pois exigia o mínimo de três dias. O meu ficava na parte comunista da cidade e achei melhor ir lá somente para dormir. Depois de andar em círculo, perdendo uns 15 minutos, cheguei na morada dos meus três amigos, Thiago, Edson Veião e Rodrigo Faggi. Os “ABC”, pois Veião mora em Santo André, Faggi em São Bernardo e Thiago, em São Caetano. Eu me intrometo e insiro o primo pobre da turma, o “D” de Diadema – tá completo o ABCD –, que além de ser o menos favorecido economicamente, não é nem “são”, logo é “bêbado”. Foi bacana revê-los em solo alemão, aproveitei também para conhecer a cearense Niara, que mora em Bilbao, Espanha. Detalhe: ela já estava “bêba”, à toda pilha 10h da manhã, e de chapéu de vaqueiro. A decepção foi a guia de Praga (por morar lá) do Thiago, a Liz. “Ela está aqui, é feia, muito chata e já rodou a banca com os gringos do albergue”, resignou-se. Além de ter dormido no corredor com as coisas à mostra.

Tão logo cheguei, já botei minhas malas no carro (Golf) alugado deles. Aproveito para já contar quão fuxiqueiros, além de modernos, são os veículos daqui. O deles, todas as vezes que dava marcha-ré, um sensor avisava a proximidade com qualquer objeto, para evitar colisões. Já o do-you-sit-móvel, do Zadá, dedava quando algum passageiro não colocava o cinto de segurança. Dava piti mesmo! No ritmo da tecnologia, os próximos não serão muito amigos: eles virão com automulta, ou seja, deu mancada no trânsito já se imprime o recibo da multa. E ainda terá a funcionalidade de inserir o cartão de crédito para quitar a dívida...

Sempre parte interessante na descoberta de um novo país é conhecer as prateleiras dos supermercados, a saber, os diferentes produtos, suas embalagens, as promoções e os compradores. Um detalhe de extrema coincidência: o supermercado se chamava Extra, mas acredito que não tenha nenhum parentesco com o de cá. Nossa compra incluiu hanutas (biscoitos alemães com as fotos dos craques locais), água (sempre cara e no calor – essencial – na Europa) e uma dúzia de maçãs, daí se popularizou a frase do Faggi: “É bom comer maçã pois é energética!” Repetimos tanto quanto mastigamos a fruta – ficamos “enfagiados”. Nesse supermercado, uma outra compra, aparentemente banal, ficará guardada para mim: a lata de coca que tomei. Mal sabia que seria a última do ano. Mas isso é outra história que já chego, parágrafos adiante.

O turismo obrigatório na capital germânica são os restos da Segunda Guerra Mundial, e que maior e concreto símbolo que o Muro de Berlim. Na área central o que há são marcas de paralelepípedo onde passava o Muro que separava mais do que Berlim – ou Alemanha – Ocidental de Oriental, e politicamente, separava capitalistas de comunistas. EUA da ex-URSS. Além disso, cruzes brancas, com o nome e data da morte do infeliz e corajoso (Ingo Kruger – 10/12/1961) que tentou cruzar o muro e recebeu tiros. Tempos de Guerra Fria e sangria que não deixaram saudades.

Ao menos para mim foi impossível ficar indiferente à energia negra do local. Embrulhou o estômago, quase passei mal. Perto, o Holocausto, um monumento aos judeus mortos na guerra. Fatos engraçados em meio à sombria atmosfera: todos os ABCDs estavam em cima dos túmulos pretos, Faggi usou humor negro e se deitou num dos túmulos. Fotografando e filmando; Veião, indiscretamente, clicou o “cofrinho” de uma morena brasileira de calcinha branca e marido branquelo (um europeu). Olha a Julia Roberts brasileira... Thiago avisou: “Vocês são loucos, olha o cara lá!”; a melhor foi uma enérgica guarda que me repreendeu com “stop it, go down”. Pateticamente, ao invés de descer, o reflexo surpreso me fez pular para outro túmulo (?!?).

Parte da Copa, as Fan Fests. Telões, estrutura de arquibancadas, produtos do Mundial, mini-campos, cambistas, personagens do mundo inteiro etc. A de Berlim ficava estrategicamente no histórico Portão. Próximo, perguntei ao vendedor o valor de uma camisa do Brasil. Além de vendedor, era o nosso folclórico membro da Comunidade, Adalberto. Dono do Jeguehome me disse o preço, “são 40 euros”, interrompi questionando se para amigos teria descontos. Ele então reconheceu e abraçou-me. O sol castigava, principalmente o mais europeus dos brasileiros, Faggi, que improvisava a bandeira nacional como burka, “o véu do Faggi”. Ele, que todos que não o conhecem, juram que é nórdico tal é sua pele escandinava. Tem até uma verdadeira história: tomava sua cerveja, desfilando seu meigo capacete viking de pelúcia – vulgo chifre – comprado na Dinamarca, quando um par de ingleses preconceituosos e bêbados disseram: “There is a fucking danish [dinamarquês] by my side...” Ele não se conteve e corrigiu: “I am brazilian....” Eles rasgaram a boca. Ao lado do fucking scandinavian, o Thiago com sua bandeira quadriculada em verde e amarela, com o símbolo do nosso querido Corinthians ao centro. Também escrito “É nóis na Copa”, que aliás, é seu blog.

À tarde Zadá me liga. Num quiosque próximo meu primeiro contato com o bratwurst, uma salsicha imensa (já escuto os maliciosos...) com um pão. Pagava com o Zadá, e a Tiazinha berlinense perguntou um algo qualquer que não entendi tampouco respondi. “Ela te mandou à merda, Zé!” Zadá traduziu o gesto dela com a mão. Nem liguei.


“Não passava nem agulhinha,nem pensamento” – Zadá contando que estava na fila do Ticket Center e presenciou que o ingresso de um rapaz a sua frente não estava na lista, e o cara tinha confirmação. Reclamou, xingou, esperneou e mais, ameaçou dedo em riste: “Em 2014 o Brasil vai ensinar como se organiza uma Copa, seus mutreteiros!”. Que heresia!!! A confusão deixou o Zadinha cagando fino, suando frio e rezando pra Padinho Ciço. Ufa, o ingresso dele estava lá.

Muitas fotos com os simpáticos croatas nos arredores da Fan Fest. Ah, as croatas! En-can-ta-do-ras-!-!-! Num pedaço do que filmei escuto o Veião babando: “Olha aquela croata!” E aquela postada em frente à mesa que estávamos provando da iguaria alemã? Essa me fez provar seu charme. Eu olhava porque sua beleza pedia admiração. De repente e sutilmente, um gesto partiu como um tiro – uma piscada! Fulminante, me atingiu em cheio. Quase derrubou. Antes fiquei na dúvida: será pra mim? Desfeita por uma testemunha. “Caralho, Zé!!! Olha a piscada que ela te deu, véio!!!” Veião exclamou enfático. O dia estava ganho – a viagem, exageram alguns –, não precisava mais e nem caberia um próximo passo. Sua doce gentileza, sem palavras, se eternizou assim...

Estreei em Fan Fests em Berlim, o jogo era Coréia vs Togo. Julgava que tinha que pagar, nada só numa estrutura de arquibancada cobrava. Zadá, fetichiado por asiáticas, queria uma foto com as coreanas. Cliquei. Eu preferi ser fotografado com uma bela germânica (foto) que fazia questionários acerca da Copa. Voltando ao telão, gol dos coreanos, celebrado com bumbo e gritos característicos da última Copa, na própria Coréia do Sul, em que eles foram empurrados pelos árbitros ladrões até a Semi. Eu abrasileirei-o assim o barrulho do tambor: “Terra à vista, turum-turum!” Zadá tinha sua versão: “Meu amigo, turum-turum!” O placar final foi Coréia 3x1, de virada, turum-turum!

Comecei a ficar preocupado, pois ainda não havia ido a meu albergue, aproveitei a carona do Veião que fora usar o banheiro (número 2, acho...) no albergue e tratei de primeiro: saber se podia ficar nesse albergue? Não, lotado; então liguei no meu albergue e pedi para segurarem reserva. Ao voltar à praça, uma informação do Faggi. “Um croata apareceu e vende um ingresso por 300 euros. Deixou telefone.” Não titubeei e liguei, oferecendo 200, a qual ele rechaçou. “Ok, caso mude de idéia, me avise.” A hora da estréia brasileira se aproximava. Mesmo não tendo ingresso gostaria de tirar fotos do Estádio Olímpico, que tem toda uma história ligada ao nazismo de Adolf Hitler. O palco dos Jogos Olímpicos de 1936, onde o americano – e negro – Jessé Owens calou o ditador com sua vitória no atletismo. Acompanhei a van da Bahia ao estádio: Thiago, Zadá e Mauricio tinham passaporte para o jogo.

“Do you still need a ticket?”, sem sombra de dúvidas uma das mais felizes mensagens de celular que recebi na vida. No ato já disquei para o croata, pois se ligou é porque concordaria em vender por 200. Informei-lhe que assim que chegasse no campo retornaria ligação. De frente à estação de metrô do estádio ouvi dele que chegaria em 15 minutos. 20, 30, 40, 50... De certo, já havia vendido, estavam pedindo de 300 pra mais. Encontrei um brasileiro que havia encontrado antes, ele ia atrás de outro esquema de ingresso. O acompanhei, me distanciando uns 20 minutos do local, quando chegou outra mensagem de “onde você está” do croata. Voltei tudo... olha a saga! Eu dizia: “Estou no meio da rua balançando os braços com a camisa do Ronaldinho Gaúcho!” Cinco minutos de mico e, finalmente, me aparece um jovem alto com a quadriculada camisa da Croácia.


Curiosamente o envelope que ele me entregou estava escrito “roba”. Posteriormente descobri com minha amiga croata que significa “roupas”. Preocupei-me com a veracidade do ingresso. “É verdadeiro, comprei na Federação Croata.” Além da convicção do cara, ele acompanhou-me conversando até a entrada. Quando algo inesperado aconteceu: o croata introduziu o bilhete na catraca e o sistema não leu o código de barras, o funcionário pediu pra ele se afastar. Pensei que ocorreria o mesmo comigo, nessa hipótese pegaria minha grana de volta. Não, deu sinal verde. ENTREI. Não atinei para o absurdo dos recentes fatos. Claro que fiquei preocupado com a infelicidade dele, liguei perguntando o que havia acontecido. “Vou resolver, pode entrar”, disse ele. Todas as vezes que penso na situação chego à conclusão que não tive culpa, afinal paguei mais de quatro vezes o valor real do ingresso (45 euros) e, acima de tudo, ERA PRA EU ENTRAR EM UM JOGO DE COPA DO MUNDO DO BRASIL.

Refeito do inusitado episódio, e emocionado, tirei fotos vitoriosas com o ingresso na mão, na minha cabeça ele já era um troféu, um futuro quadro, com a assinatura das pessoas que acompanharam o sofrimento que foi consegui-lo. Lembrei da promessa: a partir de agora um ano sem refrigerantes, pra arredondar a data do meu 33º aniversário, dia 16, um ano e três dias. Dirigi-me aonde era meu assento, atrás do gol. Na torcida da Croácia. Era mais acima de onde parei, mas como estava muito congestionada e só via vermelho e branco, estacionei de pé nas escadas. Caso alguém reclamasse, iria para o meu assento. Apesar de haver um grande número de camisas amarelas, era visível que quem as vestiam eram gringos. No meu caso não dava pra disfarçar a brasilidade. Senti-me “um invasor” no terreno inimigo. Um toque no ombro me trouxe receio. Era um amigo croata pedindo foto (abaixo). Desarmei-me. Puta bobagem, meu referencial até então era as animalescas torcidas paulistanas.

Hino nacional toca os brios do patriotismo, estando presente numa das suas execuções mais tradicionais, emociona e tira lágrimas sim. Cantei a plenos pulmões. Certamente o único a pronunciar português no local. Sinceramente “I am from Brazil” é respondido a gringos por mim com firmeza e orgulho – tá nos documentos! Independente de problemas sociais, atraso cultural, escândalos políticos, desorganização no futebol etc. Sou brasileiro pra sempre!

Dentro das quatro linhas, os brasileiros fizeram somente para o gasto na estréia e tomaram sufoco dos europeus. Kaká foi o destaque com um golaço de fora da área, dando pinta de que brilharia na Copa. No confronto de torcidas apontava um placar dilatado em favor desse país dos Bálcãs. Povo sofrido, que soube transformar suas agruras de uma recente guerra civil em vibração, união, força. Era de arrepiar o grito de guerra croata, que vinha em dois tempos. No meio do segundo tempo uma fogueira se acendeu para inflamar mais ainda o espírito da torcida. Não estive presente no lado brazuca, mas a opinião geral é essa: nós, como torcida, um bloco organizado, inexistimos, não representamos todo o poderio técnico e de prestígio da Seleção Pentacampeão. Nesse aspecto faltou os torcedores profissionais, quem lembra do Dartagnan da corneta? Nos limitamos a cantar o bonito – mas batido “sou brasileiro, com muito orgulho e muito amor...” Só e muito pouco. Eu acho que a grande maioria se preocupa mais em torcer pelos próprios times do que o país. Discordo, eu simplesmente separo Corinthians do Brasil. Torço três anos e onze meses pelo clube, um único mês sou todo verde-e-amarelo.

Ao fim do jogo, voltei de metrô sozinho presenciando a algazarra que só os meus patrícios sabem fazer de samba etc. Não consegui contato com Zadá e Thiago no estádio. No albergue, o funcionário foi extremamente by the book ao não chamar Veião e Faggi, caso estivessem dormindo (já era meia noite). Precisava pegar minhas malas no carro deles e rumar para meu albergue. Jantei próximo, e foi dado início a “era do suco”, já que refrigerantes, definitivamente, não beberei em 2006. Um sacrifício e tanto, e contando com as freqüentes provocações dos amigos. “Zé, não quer coca mesmo?! Tem certeza que não? Tá calor e tá um delicia?!” Agüentei firme, afinal promessa é promessa, descumpri-la é mentir para si mesmo e para o universo, por tabela.


Eles chegaram, tomamos uma rodada de cervejas e, às 3h da madrugada, me levaram para o All in Hostall. Cara, pelo horário e falta de almas na rua, o local parecia sinistro! No lado comunista parecia que fantasmas do derrotado sistema nos rondavam... Balelas à parte, dormi feito pedra. Dia seguinte, poderia ir de carro à Praga, com a Iglaci (Tia Glá) e seu sobrinho, Edson “Nê”, mas achei melhor conhecer mais da interessantíssima Berlim, já que eles viajariam super cedo, e deixar a carona para os ABCs, no Brasil mesmo pensei em passar a bola para Thiago e cia.

Dia 14 – quarta-feira [ ] 12h45 levantei. Meu café-da-manhã comprei no pequeno mercado: suco e biscoitos, a qual comi na bancada da vendinha. Também guardei um simples costume alemão – diria que europeu – muito saudável: o uso da bicicleta como meio-de-transporte, uma moça chegou, estacionou a bicicleta, comprou e saiu. Na seqüência iria visitar o Muro. Em tempos de Copa do Mundo o turismo perde pra futebol. No restaurante italiano, passava Espanha vs Ucrânia, um passeio de 4x0 da Fúria Española sobre Sheva e cia. O personagem da vez era do Canadá, até no nome era figura: Gordon W. Adorava conversar, de longe se notava o carisma do cinquentão, que a julgar pela florida camisa é um bon vivant. Também um cigano do mundo. Pagou-me cerveja explicando que a marca de cerveja Budweiser, era tcheca por isso os americanos perderam na justiça e mudaram o nome da famosa para somente Bud. Antes de eu partir, ele deixou convite verbal e endereço do bar onde trabalhava como cozinheiro, e passaria o segundo jogo dos donos da casa contra os poloneses.

Muro de Berlim, o símbolo da intolerância virou souvenir. Pedaços do concreto da Guerra Fria são vendidos em postais. O vendedor foi frio ao constatar: “Sofri muito no passado e hoje ganhamos com o turismo.” Tirei lascas do muro pra levar a amigos amantes de história, mas guardei tão bem guardado que nem eu achei depois. E um trecho do Muro – East Galerie – está todo pintado por artistas e pichados com frases ideológicas de ontem e de hoje. Plagiei a foto de dois turistas: um ajudando o outro a pular o muro (foto). A mesma brincadeira há 16 anos não seria encarada dessa forma pelos sisudos oficiais alemães da Gestapo. Ratátátá! E é um muro oriental (onde estava), um rio separando e outro muro, no lado ocidental. Tudo – na época – vigiado por olhos invisíveis e metralhadores inapeláveis. Ai de quem quisesse pular o muro... Ra-tá-tá-tá!

Do ex-comunismo para o centro, parada na torre Alexander Platz, um marco do socialismo. Daí a intenção era ir até a Fan Fest do Portão de Brandemburgo para ver o jogo da Alemanha. Uma alemã confirmou que estava no trem correto, mas ocorre que além da demora, visualizei pela janela matas. Opa, tou no interior de Berlim!? Desconfiei e repeti à mina que se ofereceu a dar a informação: “Brandemburgo Tor [Portão e também “gol”]?” Mal-entendido, ela pensou que queria ir para a cidade de Brandemburgo e ficou com cara de pastel. Ainda tomei canseiras de sobe-e-desces até tomar o rumo certo, antes disso, numa loja da DB - Deutsch Bahn (principal companhia de trem alemã), comprei a passagem de Berlim à Praga, por cerca de 50 euros, saindo na madrugada do dia seguinte.

Com o tempo que perdi na ida, me restava o consolo de assistir ao jogo com o Gordon W. Mas para a cagada ficar completa, tinha que ser round trip, ou seja, ida-e-volta. Não sei que zica que deu que estava alerta na estação Warshaw (Varsóvia em alemão), pois desceria na próxima. E o trem sumiu por minutos e não parava?! Simplesmente não era linha de metrô aquela, sim de trem, logo com um itinerário semelhante, mas não igual. Scheiße!!! (merda, uma das únicas palavras que meus ouvidos conseguem captar nesse idioma que fode a amizade). Um casal me esclareceu sobre o equívoco. Nos vagões de trens e metrôs é permitido carregar bicicletas. Uma delas pertencia a uma moça alta, brasileira de Araraquara que me deixou no ponto de pegar o metrô. Ela ia assistir ao jogo dos alemães com os sogros. A Bela e sua byke se foram.

O primeiro tempo, por conta das patacoadas round trip, eu já tinha perdido. O metrô ainda demorou enquanto esperava minha linha ouvindo turcos, que são dois milhões em todo o país. Desci nas cercanias de onde Gordon havia me explicado ficar o tal bar, mas sem o endereço, que perdi. Tinha o nome – 123 – e o detalhe de que ele é ilustrado com um desenho de Ronaldinho Gaúcho. Fácil. Cheguei e o placar do jogo permanecia inalterado, 0x0. A torcida germânica, calculo umas 200 pessoas, se descabelavam de tensão. Duas bolas na trave na mesma jogada – a bola insistia em não querer entrar. Comecei a me incomodar com um cachorro inconveniente do torcedor vizinho roçando na minha perna. E minutos mais tarde a explosão do grito uníssono de T T T O O O R R R R R ! ! ! ! ! chegou forte. Neuville entrou no segundo tempo e de carrinho, quase nos descontos pôs fim a agonia dos anfitriões. Se bem que quando o juiz apitou o final do jogo não teve continuação de festa no bar, como se morresse a alegria. Foi o que notei ao menos. O fato de estar com a camisa vermelha e branca, do longínquo e nanico Anapolina de Goiás, fez uma alemã brincar se eu não estava com a camisa da Polônia, de similares cores.... rs... imagina?! Ainda bem que nenhum idiota não pediu pra eu tirá-la, assim como fazem nos estádios brasileiros.

Findo o jogo, bateu fome e como meu recente amigo é cozinheiro, lhe pedi para preparar sua refeição. Gordon W. garantiu que era a última da noite, uma massa redonda com carne e folhas ao centro. Delícia! Foi cortesia com outra cerveja. Logo mais chegou um croata na roda próximo ao quiosque – Martin –, que contou como foi sua experiência no Brasil e falou também sobre o significado do grito de guerra croata, o expressivo sentimento que emanou no jogo de ontem. É impressionante como todo croata que conheço só faz crescer a admiração por esse povo guerreiro! Assim vou pra Croácia. Quem sabe não encontro a Deusa que me piscou? Minhas chances são uma em um milhão, como diria outro Debilóide.

A decisão de passar a noite acordada foi lógica: minhas malas estavam no albergue e não compensaria pagar 25 euros pra dormir três horas, já que meu trem partiria 5 am. Gordon W. ia pra outro trampo próximo, nesse ele era músico. Uns 30 minutos de caminhada, chegamos na balada berlinense, à beira rio. Exótico local. A cantora era uma gata austríaca (foto). A performance dela com o Gordon W. misturava mímicas, mixagens, sonoplastia e o vocal suave da loira – uma salada só. Valeu o ingresso que não paguei! Sinceramente disse ao Gordon W. por conta dos erros – round trip – de tráfego, mais principalmente toda a gentileza: “You saved my day!”

Pra encerrar o assunto Berlim, da balada até o albergue, caminhando na madrugada de mãos dadas ao Muro – tudo deserto – caminhando pela história. Uns três quilômetros do que já foi 153. Um powerade sozinho para brindar inusitado momento e confesso: enriquecedor. Outra tarefa obrigatória: escrever à caneta o nome do meu amigo, companheiro filiado ao PC do B “GUI” no muro. Ele adorou estar presente no símbolo – ainda que caído – do socialismo. No albergue, peguei as malas e combinei um táxi, pra acertar o valor da curta corrida, o taxista, que não falava inglês apontou no mostrador o preço de mais ou menos 10 euros. Perfeitamente pagável a essa hora da matina.

No trem da DB me engajei com uma galera do Sul que ainda não tinha passagens. Compraram dentro dos vagões mesmo com os oficiais da empresa. Difícil a missão de dormir, pescava e nada. Quando consegui, parece mentira, mas uns coreanos lazarentos foram reclamar que estávamos nos assentos deles?! É o cu da cobra mesmo! Nem adiantou bater boca alegando que em nenhum lugar dizia sobre ter que reservar com antecedência. Levantamos e procuramos outra cabine de seis lugares. Breve, passaram os agentes de imigração tcheca pedindo passaporte para carimbar a entrada nesse país do Leste.

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Paris: parada obrigatória

Greve, Piripaque Stadion, Árvore de Natal Gigante, jogador americano e taxi indesejado

Pra funcionários TAM aqui é parada obrigatória, porém e eba, até outubro, quando alçaremos vôo para Londres. Em Paris esnobei a amigos que, sinceramente era de fato obrigado a parar, isso porque essa é a terceira vez que visito a Cidade Luz e, principalmente, estava louco para encontrar a galera da comunidade do Orkut Copa 2006: eu vou, que marcaram encontro em Berlim, no Portão de Brandemburgo (“Luxemburgo”, apelidou o Zadinha). Só não fiz porque isso significaria quase uma centena de euros a mais. Fiquei, a contragosto, na capital francesa.

Passaporte novo estreado com carimbo e malas, frente e verso, pronto para ir para o Stade de France, que fica no sentido aeroporto – centro. Comemorei o fato de não ter que pagar 10 euros do trem – estava de greve –, só que na estação do palco da final da Copa de 98, simplesmente não abriu a porta. Já que foi assim decidi ir direto pro albergue descarregar malas e descansar. Não é que os trens estavam contra mim? O que peguei foi pra Saint Denis, parada do estádio. O erro meu se justificou, pois estava na plataforma correta, mas para saber qual das estações seria bastava ler no painel acima. Descobri tardiamente. E tomei outro baile mais adiante, tudo bem, faz parte do programa, ainda mais quando se considera minha aversão ao idioma napoleônico.

Nas ruas parisienses deparei com uma das tônicas dessa excursão européia: sol, e seco, que mata! Nunca pensei que fosse subir dos Trópicos para derreter no Hemisfério Norte. Para exemplificar lembro de uma francesa que andava poucos metros e borrifava um spray refrescante. Eu como não tinha spray fresco caminhava sob o peso das malas. Pronto, estava de frente ao Piripaque Stadion, aqui havia oito anos o mundo assistiu ao ataque de Ronaldo e o seguinte banho dos franceses nos brasileiros. Até hoje eles sacaneiam com “et un, et dos, et troux e et zéro” e até hoje não se sabe ao certo o que aconteceu naquela tarde que justifique tamanha apatia canarinha. Sinceramente só tirei uma foto, comprei dois postais e não entrei na tour de 10 euros pois: a lembrança era quase mórbida, teria que esperar uma hora e o sol já estava torrando o cérebro, além do valor supra citado. Vazei.

Cheguei no albergue junto com dois argentinos, logo o assunto era futebol, Carlito Tévez, Seleções, enquanto na TV a Austrália fez três gols em poucos minutos e virou o marcador para 3x1 contra os nipônicos. Ê Zico zica! Feito check in, atravessei a rua, descolei uma refeição que tinha arroz esquisito e República Tcheca 3x0 Estados Unidos. De volta ao albergue, puxei papo com um argelino que explicava que o bairro onde estávamos (Clichy) era reduto argelino, mas que tinha que ter muitos “papéis” para conseguir permanência em solo francês. Depois tomei parte numa conversa de dois americanos, contrariando o escurinho que não acreditava na Seleção verde-e-amarela e demonstrava conhecimento de táticas: ele, Ben, joga futebol profissional e inclusive estava na Europa para testes, porém, teria que voltar, pois tudo estava parado devido à Copa do Mundo.

Era quase 21h, o dia ainda estava claro e descemos pra ver a estréia da Seleção da Pizza e da Macorranada contra os africanos de Gana: 2x0 Itália, mas é porque os adversários ainda são muito ingênuos na defesa e perderam muitos gols. Sugeri para o Ben, pós primeiro tempo, irmos ao centro, nos arredores da Torre Eiffel. Aceito. No metrô, em propaganda, Ronaldinho Gaúcho vendia café. Fora, a Torre sempre me impressiona por tamanho, forma e luz. Me ilumina e continua sendo o monumento preferido, de amor à primeira vista. Dessa vez, Ben chamou-me atenção para um fenômeno de banho de luz, como se fosse uma grande árvore de Natal, irradiando seu brilhante pisca-pisca. Fotos e filmagens deram uma pequena noção do showzinho. A amiga Giovanna, na véspera me lembrou que chegaria no dia dos namorados. “E você em Paris, hein Zé?”, brincou Gi, porém, faltou uma cia feminina. Dizer que estava com o simpático Ben será motivo de troça dos amigos que adoram me zuar. Na área da Torre comprei dezenas de mini-torres pra presente e uma grande, com botão de acender. Essa vai iluminar minha estante do quarto.

A volta foi um sarro: terceira vez aqui e ainda não me liguei que não se deve jogar o bilhete do metrô fora, sim usá-los pra sair de um embarque para outro, ou baldeação. Por isso a cada catraca que encontrávamos tínhamos que pulá-las... e foram várias. Se algum guarda nos parasse iríamos ver se francês iria engolir explicação em inglês... No albergue por volta de 1h, a notícia ruim do dia: meu vôo Orly – Berlim saía 6h30, cedíssimo e, para meu espanto e despreparo, as conduções da cidade só começariam a funcionar às 5h30 e é um tanto distante. Ou seja, táxi. Já os odeio em reais, em euros eu choro. Mas pago. Tive que pagar, pois não haveria outra alternativa. Dormi insuficientes três horas acordado pelo despertador do celular, às 4h30. Combinei o táxi, por volta de 40 Euros. O motorista não falava inglês, mas mostrou no digital do taxímetro o valor da facada. Olho no nascer-do-sol com taxímetro distraía meu caminho, num percurso de 30 minutos. Au revoir, Paris.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Boas festas 2007

Luz, muita luz, banho de luz
Em praças de São Paulo, luz
Nas casas, nas árvores, luzes

Meu Deus, por quê tanta LUZ?
Nasceu Menino Jesus, é NATAL

Luz pra que se ilumine a alma
E se enxergue o homem humano
Que se aflore a espiritualidade
Pedindo paz. Perto de Deus

Trazendo pra vida terrena
Próximo à FAMILIA

Desejo isso a quem me lê
Estejam perto de Deus
Da Família
Sorte de quem a tem
Com isso, se atinge a Paz

O resto
Saúde
Sucesso: emocional, profissional e financeiro
É conseqüência

Feliz Natal
E 2008!

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Cataratas de Foz do Iguaçu

2003. Lado das Cataratas argentinas, em Puerto Iguazu, cidade de 28 mil habitantes e há 10 quilômetros do centro de IGU: imperdível! Foi cobrado 20 de transporte + 18 pela entrada no parque + 30 do passeio de barco. O transporte foi de ônibus, bem desconfortável por sinal. Não liguei, o motorista era uma piada. O argentino Juan Pablo, ao saber que só eu era brasileiro, me pegou pra Cristo. “Brasileño peligroso”, brincou. E falava mais que a boca: “Meu nome: pras chicas bonitas Tom Cruise e pros chicos feios, Drácula...” Além de tudo, era torcedor fanático do Boca Juniors, o atual campeão mundial. Carregava no ônibus uma bandeira azul e amarela do time e, freneticamente, desfraldava a toda cidade de Puerto Iguazu, onde nasceu. Imagina se esse chato de galocha não zoou todo torcedor do River Plate, grande rival do Boca, que perdera a final da Sulamericana pra um time inexpressivo do Peru, Cienciano, e com um jogador a mais. O marco da cidade é Três Fronteiras. Imagine um rio em forma de “T”, em que à direita está a Argentina (onde eu estava); à esquerda, minha pátria verde e amarela, do outro lado do Rio Iguaçu (representado pelo pé do “T”); e além do Rio Paraná (a trave superior do “T”), o Paraguai. Descrição feita com a colaboração do imã de geladeira comprado lá. Fui claro? Senão desenho, mostrando o imã.

Chegado ao Parque Nacional Puerto Iguazu, a maior reserva de floresta pluvial subtropical do mundo, que é dotado de invejável infra-estrutura. O transporte dentro do parque é feito através de trens, que conduzem a várias trilhas através de pontes sobre o rio Iguazu. Ainda bem que escolhi um dia de céu e sol intensos pra contemplá-las. Muito verde, passeando o divertimento era fotografar as borboletas. O Stefano (suíço) era tarado por elas. O objetivo era o mirante da “Garganta do Diabo”, a parte principal das Cataratas. De longe, já captamos o ensurdecedor barulho, a vista é de um monstro de água e fumaça de água – um mundo de águas à direita, esquerda e no horizonte! Junto às águas, pássaros produziam um balé soberbo. Os ventos traziam jatos de água, junto vinha o alivio que eles proporcionam. 275 quedas que oscilam entre 40 e 90 metros. O volume de água é tão grande que, ao cair, forma um vapor constante envolvendo a vegetação. Maravilhoso foi o efeito arco-íris. Ao vivo vi e na tela da minha máquina digital eu o transferi, falta imprimir a poesia visual de águas, verde, outras cores, brilho e emoção. Descendo por passarelas, várias perspectivas do já amplamente citado espetáculo. Munido de escada e guarda-chuva, um funcionário do parque tirava as fotos. Pois não é que eu tinha batido duas, e me sumiu a paisagem no visor digital da recém comprada máquina Sony... “Mas será que essa merdinha é tão sensível assim? Pronto, comprei ontem e já a estraguei, ferrou...”, me resignei. 15 minutos calado, quando, já longe das quedas, ativei o visor que desativara sem querer. O humor então assim voltou e pude, foto a foto, fazer um wonderfull waterfall flashback. Faltava o passeio de barco. 15 minutos emocionantes. O barco balança muito e é quase que engolido pelas gigantes e furiosas Cataratas. Sensação indescritível! Terminamos encharcados & maravilhados! A ducha natural serviu pra lavar, literalmente, a alma.

O tempo começou virar ao fim da tarde, ou foi só a gente (eu, o alemão Christopher, o suíço Stefano e a espanhola Tâmara), avistar o ônibus, a cerca de 50 metros, fechou o tempo e mais água. Dessa vez não era cascata, era temporal! Corremos e, os últimos, chegaram molhados e foram zoados pelos secos & sentados. Ai foi voltar pro Brasil. O Juan Pablo ainda aprontou uma comigo: recolheu os passaportes e meu RG pra passar na fronteira, ao devolver, colocou os documentos dos estrangeiros e nada do meu brasileiríssimo RG e o ônibus já tinha partido. “Cadê, argentino?” Tava escondido. Cheio de graça...

Unanimidade: o lado argentino é mais bonito, também maior: correspondente a ¾ das Cataratas. Doído pro orgulho brasileiro afirmar isso. No entanto, a disposição dos saltos – a maior parte deles voltados para o Brasil – permite ver todos a um só tempo apenas do lado brasileiro. Ou seja, é de lá que se vê o todo e se completa o pacote. Paga-se 11,40 pela entrada no parque. A exemplo do lado vizinho, vários mirantes. O ápice é uma passarela, onde o banho refrescante na alma está incluso. O arco-íris também é brasileiro. Retornei e vi que não havia mais trilha, escapando um sonoro e monossilábico “só???” Mas esse “só” não foi de decepção, o que vira compensou com sobras – estava plenamente satisfeito! Mesmo assim o barulho da quedas e a beleza sublime da vista me convidou para um derradeiro e feliz bizz. Também cá com meus pensamentos conclui que rodara o Brasil e deixei Foz do Iguaçu pra ser o (talvez) 50º destino. Tarde, mas o momento foi mágico e entra num canto restrito de paisagens de Deus. Privilégio ver.

Em matéria de Cataratas lembra-se das também imponentes Niágara Falls (na fronteira dos Estados Unidos com o Canadá). A ex-primeira dama americana, Eleonor Roosevelt, ao ver Iguaçu, sentenciou: “Pobre Niágara.” Em épocas de cheia o volume das Cataratas sul-americanas são sete vezes maiores que a norte-americana, resultado do tamanho do rio Niágara com um trajeto de apenas 40 quilometro contra 750 do rio Iguaçu. Vendo as fotos notei uma peculiaridade entre ambas: Niágara é no meio da cidade quase; ao passo que Iguaçu é situado num parque dentro de uma imensa floresta da mata Atlântica.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Chi-chi-chi-lê-lê-lê

2004. Chi-chi-chi-lê-lê-lê, assim os torcedores saúdam a seleção chilena. Duas semanas atrás, num vôo Foz do Iguaçu/Curitiba, um grupo de adolescentes puxou o coro por farra. Esse é o título sobre esse país que, uma vez respira os ares da democracia, cresce a olhos vistos e, turisticamente é, ao lado de Buenos Aires, um destino muito atraente pra muitos brasileiros que se assustam com euros e dólares. Desembarcando em Santiago, algo inédito pra mim: CLAP CLAP CLAP. Palmas para o pouso (?!), as estendo para a capital e por extensão, para todo o Chile.

Tão logo entreguei o formulário da imigração, logo, dou de cara com um guichê de câmbio. Conselho da Luciana (amiga que visitou Santiago recentemente): “Se você tem 10.000 Pesos Chilenos, corte dois zeros e divida por dois. Ou, 5 Reais.” Na notinha da operação vi o câmbio: 1 Real corresponde a 185 Pesos, o que já inseri numa fórmula de excell no palm top.

Dinheiro trocado no bolso. Bolsa nas costas. Mapa da cidade na mão. E do lado de fora, um sol no céu. Cerca de trinta minutos até o centro, no buso centropuerto. Daqui pra baixo os tópicos sobre os quase quatro dias em Santiago. Pode até, se preferir, escolher e ler o assunto de maior interesse e descartar outros.

· Brasil
Para começar a rua do albergue ficava de esquina com a Calle Brasil. Andando mais uma quadra, Plaza Brasil. Quer dizer, o bairro todo é Barrio Brasil. Uma amiga especulou: “Isso graças ao Lula, né.” Não, o Companheiro não construiu o gigantismo do país, potência do continente e que conta com a fartura de craques do futebol para espalhar mais ainda a bandeira brazuca pelo continente e mundo.

No primeiro dia cansei de ver camisas verde-amarelas (uma era do Andréas Kisser, do Sepultura), goleada nas azuis e brancas da rival Argentina e batendo as vermelhas chilenas. Nos outros dias, a diferença diminuiu senão empatou: muitas camisas do Boca Juniors – melhor time do continente. É claro que se deve levar em conta, além proximidade geográfica argentina, o idioma.

A primeira refeição teve trilha sonora especial: “Bwuna, Bwuna (...) Adeus sarjeta. Bwuna me chamou. Não quero gorjeta. Faça tudo por amor.” Música da dinossaura do rock, Rita Lee, que trouxe bem-estar e fez a comida descer leve, leve. Devo confessar que se tem uma coisa que me faz cantar a plenos pulmões, é quando estou no exterior e toca música brasileira. A pronúncia português sai com gosto e orgulho.

Pra finalizar, dia 20, a notícia do dia, via site da gazeta esportiva: Ronaldinho Gaúcho é o melhor jogador da FIFA. Dia seguinte, sua foto era destaque num dos principais jornais local, o La Tercera.

· Albergues
La Casa Roja. Endereço: Agustinas 2113 - Barrio Brasil, 10 minutos da estação do metrô Los Héroes. Prédio vermelho e antigo, pedindo umas mãos de tinta. Esperava encontrar funcionários chilenos, mas me deparei com uma torre de babel: dono australiano, mais recepcionas alemã, suíça, americano e um outro com a camisa da África do Sul. A alemã me atendeu e a suíça me levou até o quarto, no segundo andar. Antes passei por um cachorro enorme, deitado no sofá da sala, como se fosse o dono do pedaço.

Ao entrar no quarto: “What a big mess!”, verbalizou a suiça o que meus olhos constataram: no chão, três pilhas de roupas e badulaques dos mocheleiros. Disse também, porém, como se fosse a coisa mais normal do mundo. É bom que se deixe claro que só deixaram desse jeito porque não há armário no quarto. Sou bagunceiro, mas aquilo foi demais.

Só não pedi reembolso (paguei três dias antecipados), pois dentro de mim havia um lema positivo de “nem tudo é como parece ser”, que encontraria amigos e relevaria à estadia a um plano bem inferior. Nada, atmosfera é tudo, e ela não conspirava a favor. Primeiro albergue em que pago café da manhã. Até uma vantagem se virava contra: os vinte minutos diários de Internet grátis, mas também, os teclados eram precaríssimos.

Quando perguntei ao recepcionista americano se poderia pedir devolução e ele fez com os ombros “no problem”, fiquei felicíssimo. Rapidinho fiz as malas e fui para um outro albergue, ruas próximas, a qual já tinha sondado valores e condições. Tanta felicidade que já nas ruas, de havaianas, dei por falta de meu par de tênis; estava debaixo da cama...

Esse é credenciadíssimo do Hostelling International. Endereço: Cienfuegos 151. Também na estação do metrô Los Héroes, a quatro quadras da Alameda Libertador Bernardo O’Higgins, que corta a cidade de ponta a ponta. Comparado com o outro, R$ 8 a mais. Compensa com sobras em estrutura: dois micros disponíveis pra Internet grátis, quartos para só quatro pessoas com armários espaçosos, limpinho e acolhedor. De igual ao anterior, só o fato de necessitar pagar o café.

Assim que voltei do centro, na Internet, já puxei papo com uma garota com a camisa do Brasil, mas que de maneira alguma era minha conterrânea: procedia de Londres – também não tinha cara de européia?! Filha de indiana com africano, bem exótica. Super simpática, já me convidou pra beber com a galera do albergue.

Num hipotético placar contra o outro, apontaria uns impiedosos 6 x 1 para o Hostelling International, o primeiro só leva vantagem no valor.

· Passeios ao centro e Cerro de San Cristobal
Falando em havaianas, elas, fashion, graças ao comercial da Naomi Campbel e a top-model brasileira, Fernanda Tavares da MTV, rodaram bem pelo centro. Dos enormes prédios do poder político, La Moneda à ampla Plaza de Armas, onde outrora foi casa de Pedro Valdivia, fundador da cidade. Onde se destacam uma igreja catedral, correio central, prefeitura de Santiago, um bar no meio da praça cercado por divisórias de meio metro, artistas de ruas, pintores, ambulantes, eventos e muitos passantes. É o coração da cidade, senti bater. Ainda mais em época de Natal, quando as ruas se enfeitam com os adornos habituais.

Cerro, que porra é isso? Em Santiago, como pontos de interesses, tem vários deles. A principio imaginei ser um mercado. Nada, é um monte com vista privilegiada. Pra chegar ao mais famoso deles, o Cerro San Cristobal, grande protetor da cidade, recebendo a estátua de Virgem Imaculada Concepción ao alto do monte. Está localizado dentro de um parque, meia hora caminhando desde a Plaza de Armas. Ao chegar lá, a curiosidade era o funicular, espécie de bonde utilizado em subidas íngremes, mas ia demorar e preferi subir de van. Deste cerro se tem a vista mais privilegiada da capital chilena.

Paguei pelo teleférico que leva até um bairro residencial, devo ter circulado uma meia hora. No começo, sozinho, dentro do vagãozinho, me senti o “folgado”: sentei com as pernas apoiadas no outro banco. Quando ele parte, dá uns trancos e tremidas, olhei pra baixo e confesso que bateu um leve medo: “E se esse ‘trem’ resolve cair comigo?”, pensei. Bobagem, foi que foi e a vista é preciosa!

Pra descer o tal do funicular, já pago, encrencou e não teve acordo, não poderia aguardar uma hora pra ser restabelecido. Desci de táxi. Em Viña del Mar e Valparaíso também não deram certo esse transporte. Zica mesmo!

· Gringos
O primeiro que conheci foi um alemão, Mark, no restaurante Vaca Gorda. Como já tinha o visto no La Roja, pedi pra sentar na mesma mesa. Conversa vai e vem, descobri que o drama dele era alterar o vôo, pela TAM, do dia 24 para o dia 23. Em férias, dei uma consulta, diria: “Você tem que checar se há disponibilidade na mesma classe e, certamente, terá que pagar de taxa de remarcação cerca de US$ 100,00.” Arruinei o dia do alemão. “Tudo isso? Que absurdo!”
Recomendei consultar pelo nosso serviço de chat, até ia com ele pra auxiliá-lo, mas disse que não precisava. Esquisito ele!, então que pague e traga assim, mais lucro pra empresa. Outra divergência com o Mark: quando veio a conta, o garçom perguntou se poderia incluir a propina (gorjeta) no cartão de crédito: uns R$ 3. Como é opcional, o valor da conta estava acima do orçamento e porque propina me cheira corrupção, decretei: “No propina!” O garçom e o alemão, pelas expressões, desacreditaram. E eu com os ombros, “tô nem aí...”

Um uruguaio, Cristan, puxou conversa comigo num bar, na Plaza de Armas. Aqui a negócios e cheio de histórias. Falou sobre o tempo em que viveu em algumas fazendas de Minas, ele é veterinário. “Gosto de animais.” Conhecedor de todo o continente sul-americano, preferiria morar em Paramaribo, Trinidad Tobago, “não há as loucuras das grandes cidades”. Alertou para o crescimento do Chile, país que é bem menor que o Brasil, portanto com menos problemas. Inclusive, segundo o uruguaio, é o melhor lugar pra se fazer negócios, ele mesmo está se mudando para cá. Quanto o assunto foi mulher, foi polêmico: “Gostaria de ser polígamo como no Oriente Médio. Mas tem que ter um número impar de mulheres, para não haver discordância. E mulher não pode pensar muito, temos que pegar uma pedra bruta pra moldá-las.” Machista, não? Mas o Cristan foi super bacana e deixou um recado pra quando estiver visitando os lugares: “Não importa o local, sim as pessoas. Falar com gente, sentir suas necessidades.” Achei o profundo em sua semi-embriaguês. Depois me enchi do seu papo e fui andar...

Duas garotas do segundo albergue, coincidentemente, trajavam camisas da seleção brasileira. Uma já apresentei (a inglesa-indiana-africana). Já a outra, Cristine, americana, morou seis meses em Belo Horizonte. “Sou Galo [Atlético] desde criancinha”, garantiu convicta, num fluente português, aliás, ela adorou o Brasil.

Dois australianos, Jeremy e Esquecido (simplesmente esqueci o nome do carinha de Sidney). O outro era de Melbourne, segunda maior cidade australiana. Voltando da janta, dentro da praça, um deles cismou que queria se mostrar numa rampa de bike. Pediu então a bicicleta, bem menorzinha, emprestada de uns pivetes. Imaginei que fosse dar o show, fez nada demais. Já o Esquecido fez: tomou um tombo e alegrou a noite de todos! Bem feito. As holandesas eram bonitinhas, mas não peitudas como corre a fama delas. A Elke e a Caroline, ambas se conheceram em viagem. A Elke, na janta, ameaçou que ia tocar piano no restaurante, mas mesmo a pedidos, amarelou. Já a Caroline está chocada até agora: na praça surgiu um cão dobermann enorme, queria só brincar. Empolgou-se e, literalmente, encoxou a pobre da holandesa – cena dantesca! Quase chegou às vias de fato, com roupa e tudo. Sexo animaaaalllllll!!!!! Todos, mesmo aos risos, desacreditaram. Depois que ela se recuperou do trauma, agüentou as brincadeiras numa boa. Pena que não fotografei nem filmei.

“Puedes sacar una foto?”, pediu uma garota, em frente ao relógio de Viña del Mar. Tirei a foto, mas notei o leve sotaque da moça. “Você não é do Brasil?” Bingo, era. De Minas, sô. Vai ficar na categoria “gringos” por pura falta de outro tópico. Taciana era seu nome. Ela adorava perguntar, sempre queria reconfirmar uma informação dada, 100 metros depois. Irritava. Andei com ela de Viña até Valparaíso. De trem, como todo bom mineiro.

Físico, cidadania israelita, morou na Alemanha e nasceu em Bagdah. Esse era o tio Jamil. Quem conheceu tal figura foi a Taciana, no ônibus subindo para o museu do Pablo Neruda. Falava espanhol com ela e inglês comigo. Fofocou comigo que não gostou que a mineira quis sair do vídeo do Neruda na metade. Só ouvia, mas a mineira era chatinha mesmo. Outra queixa do judeu era que não pagaram a palestra que ele deu na Universidade do Chile. “Nem valor simbólico”, lamentou. Nas ladeiras de Valparaíso propôs uma cerveja. Segundo as leias chilenas, não se pode beber cerveja na rua, advertiu a advogada Taciana. O Jamil nem deu bola: tomamos a cerveja com uma vista – estarrecedora! – do Oceano Pacífico e casas tombadas pelo Patrimônio Histórico da Humanidade.

· Diferenças
Andando nas ruas centrais tem que ficar esperto. Isso porque o piso não tem o nosso rebaixo da calçada, ocorre, porém que nas extremidades passam carros. Achei curioso. As bancas de jornal (que não vendem cartões postais) são uns quiosquinhos bem pequenininhos.

Uma diferença que me afetou foi pra recarregar o palm top. O pino é só aquele de dois furinhos, diferente do “pino americano” retangular. Tive que comprar um adaptador.
O metrô é bem moderno, ali com o de São Paulo. Ambas com cerca de 50 quilômetros construídos, a diferença é que a população de SP é umas quatro vezes mais que a de Santiago. Outra vantagem nesse metrô são umas televisões digitais nas estações. Só não pergunte qual a programação.

Essa me ganhou: segurança. Praça Brasil, meia-noite e meia lotada. Feirinhas, bikers, outros tocavam violão, um casal se beijava tranqüilamente. Nós (as duas holandesas, os dois australianos, a americana e eu) fazíamos um picnic, na verdade compramos quatro cervejas e tomávamos sentados na grama. A mesma do cão tarado. Voltando na questão central, nem a pau que dá pra se fazer isso em São Paulo com o alto índice de criminalidade... eu, ao menos, nunca vi. Estou falando de Santiago, que é mais do que quatro vezes menor que Sampa, mas mesmo assim é uma cidade mundial. Coisa elogiável. E a Praça Brasil ficou de ironia... Utopia, lamentavelmente, que o “País Brasil” não seja assim.

· Comidas, bebidas e tempo
Pra comer me virei na base do pollo (frango) com arroz. O frango era só uma grande peça de coxa. Já comi melhores e piores. Também comi as parriladas e lomos, tipos de carne. Quanto ao nosso feijão, não constava no cardápio e nunca perguntei se tinha, aliás, nem sei como se fala em espanhol. Arroz é arroz mesmo. Tomei em cinco oportunidades a cerveja chilena Escudo. Não me convenceu.

Comprei um vinho chileno, Casilero del diablo, Merlot. Nome de meter medo. Pois chegada a noite de Natal, aqui no Brasil, a expectativa era grande pelo vinho importado. O amigo Fernando falou que se deve segurar embaixo da taça e mexer pra dar um barato. Bebi. Sem cerimônia, eu não gostei. O Gui disse que era forte. Fernando, Sérgio e Toninho gostaram. “É um vinho pra se beber com carne. É bem sofisticado”, teorizou o Fernando. Conclui que, por não ter gostado, não sou sofisticado.

Saí do Brasil com o rótulo das transmissões de futebol de que Santiago é a capital mais fria da América do Sul. Sim, mas no inverno. No verão, nos três dias que fiquei, sol bem quente e agradável. Sendo assim, o sobretudo e a blusa só fizeram peso. Se bem que poderia utilizar numa eventual ida às Cordilheiras dos Andes. Não fui.

Se na capital tá sol, com o mar de Viña del Mar, será o casamento perfeito: sol e mar, pensei. Deixei até uma bolsa, com as blusas e outras peças, no albergue, pra não carregar peso. Logo na rodoviária viñamarista, às 14h, surpresa: como venta no Pacifico, demais! Frio, me senti um panaca, outra invertida climática! Comprei blusa até, pois estava quase que insuportável. No decorrer do dia o céu abriu mais me fazendo pensar que no dia seguinte daria praia. Que isso!, li agora o que site diz sobre as águas do Pacifico: “A água fria do mar não esquenta nem no verão, devido à corrente que vem do pólo.” E mais: “Há neblina matinal nas praias de Viña del Mar. Mas não se desespere. Depois do almoço, o sol aparece” O site está certo, de fato o sol – viadinho – apareceu, mas eu havia de voltar pra Santiago.

· Gentilezas do povo
No geral não agradou. Alguns eventos chatos, nada de extraordinário, no entanto: na Plaza de Armas, pedi uma cerveja média. A garçonete trouxe uma grande. Não aceitei, pois era o dobro do preço. Ela retirou a garrafa, tampou a tampinha com um murro, fez uma cara de “fezes” e foi buscar a menor.

No metrô, comprei um bilhete ida-e-volta. Inseri o bilhete e a máquina não devolveu o da volta. O guarda, vendo, perguntou se eu tinha comprado mesmo ida-e-volta. Claro! O guarda foi ao guichê confirmar o que havia acontecido com o caixa, acabou achando melhor abrir a catraca e eu mesmo se entender com o caixa. Já cheguei argumentando firme que paguei bilhete duplo. Ele não falou nada, fez que não queria muita discussão e deu outro bilhete com cara de poucos amigos. Eu, heim, os caras batem cabeças!

Nas duas vezes que fui comprar cerveja (em Viña e antes do picnic) também um tratamento meio tosco, sem uma razoável boa vontade.

Mas obviamente há os bons exemplos: a tiazinha da pousada que fiquei em Viña del Mar recomendou com sinceridade: “Não confie em crianças, idosos ou chicas [garotas] bonitas. Mantenha os olhos abertos por aqui.” É, malandro, jacaré marcou virou bolsa...

· Pinochet

Todas as esquinas em que andava, imaginava como seria esse país em tempos duros da ditadura, há menos de quinze anos. Principalmente no prédio de La Moneda, onde choveram bombas em Santiago, no Golpe Militar do General Augusto Pinochet, que tomou o governo socialista de Salvador Allende, em 1973.

O autoritarismo de Pinochet deixou cerca de 3.000 mortos ou desaparecidos, entre eles chilenos e simpatizantes estrangeiros, durante a repressão que se instalou entre 73 e 90.

E hoje vovô Pinochet, aos 84 anos, covardemente, implora pra que lhe dêem tratamento de insano, pra só assim não pagar pelas atrocidades que cometeu. Ainda há 60 processos contra o general em cortes chilenas. Esta é uma Nação ainda dividida nas questões ideológicas e que ainda não superou os terríveis desdobramentos do golpe militar. Ainda há hoje aqueles que simpatizem com o General. “Ele nos salvou de um governo comunista e depois nos entregou ao regime democrático”, defendem muitos chilenos. Os iludidos.

· Chilenas
Decididamente se você, caçador, quer ir atrás de mulheres, não vá ao Chile. Elas são hor-ro-rí-ve-is! E que nenhuma delas me leia, por favor. As que apresentavam rostos mais ou menos, tinham corpos desconjuntados, muitas! Em Viña del Mar, os ventos do Pacifico, melhoraram um pouco meu achômetro.

No ônibus de Santiago a Viña del Mar, encarei uma morena firmemente, ela retribuiu, não tenho dúvidas disso. E nada de vir a coragem pra sentar ao lado, mandar bilhetinho etc. Estava ganhando tempo… Nesse jogo de troca de olhares, ela foi sentar lá no fundão. Xiiii… uma ducha de água fria em qualquer pretensão. Nunca saberei o que ela pensou e nunca esquecerei aquele olhar. Quando o buso chegou ao destino, uma tiazinha estava esperando por ela, que acenou. Vai ver que a melhor chilena que namorei – com os olhos – tem namorado. É um consolo – menina séria!

Em Viña, um entregador de legumes fez um carnaval tremendo – “uau!!!” – pra saudar uma chica de formas generosas. Aqui no Brasil então o que ele faria? Falando em traseiro, meu inglês não captou bem um papo dos australianos com a americana: mas parece que o Jeremy viu uma carioca que o tirou da órbita pelo resto da noite. “What a behind!!!”, exclamou babando.
No metrô, de frente a frente, duas gatinhas. Mas ainda assim insuficiente. O que me tornou critico em relação às chilenas foi ter passado mal em Porto Alegre, só gata tri-tetra-penta BOM & GOSTOSA!!! Inglaterra, França, Argentina, Paraguai e agora Chile. Em nenhum desses países que conheço, há mulheres como no nosso Brasil. Ainda que gosto seja extremamente pessoal – e sendo brasileiro, sou parcial – temos um paraíso feminino.

· Vinã del Mar e Valparaíso
Viña del Mar é um brinco do Pacífico. Amei essa jóia rara que pode ser considerada o Guarujá do Chile. Ainda que ao chegar o tempo não tivesse sorrido pra mim (ler “comidas, bebidas e tempo” acima). Charmosa demais e pelos carrões importados e lojas de grifes, tem grana! Um convite aos passeios e às compras. Indo pro Oceano, do lado esquerdo, os funiculares (outros que não me aceitaram…). Sem dúvida quero voltar pra andar mais nessas ruas agradáveis. Vinte minutos de trem ou micronibus e se chega em…

Valparaíso, cidade histórica. Grande parte, com seus casarões coloridos de dois e três andares, tombados pelo Patrimônio Histórico da Humanidade. Ou seja, prima do Pelourinho. Cidade de cais é também perigosa, drogas, prostituição e crime, não vi nada, mas uma meia dúzia pediu pra andar ligeiro.

O clichê vale: vir aqui e não subir até a casa de Pablo Neruda, não veio, definitivamente a Valparaíso. Chamada de La Sebastiana, tem cinco andares. O poeta famosíssimo mundialmente e Prêmio Nobel da Paz, decorou seu refúgio de veraneio a dedo: obras de artes, espelhos e mais dezenas de detalhezinhos. O resultado final é de profundo bom gosto. O que se enxerga de qualquer um dos andares faz de qualquer mortal um imortal das letras.

Obs: aos fotógrafos só é permitido mirar o horizonte, o Pacífico – o quê não é desprezível –, e as funcionárias viram feras àqueles que desejam clicar um alfinete que seja dentro da casa.

· Espanhol
O ponto mais enriquecedor desses quase quatro dias nos Andes, indubitavelmente, foi o espanhol que se encorpou um bocado e cada vez mais se distancia da muleta do portunhol. Considero que já passei da metade do caminho que compõe a estrada de idioma rumo á fluência.

Se inicialmente o castelhano falado soava árabe – normalíssimo –, no aeroporto santiaguino, a confiança me permitia pronunciar firme. Na véspera da partida, assisti televisão chilena e no último dia, devorei jornais chilenos.

Mais: fiz a descoberta do ano em matéria de idioma: os espanhóis - puta de uns preguiçosos - devoram o “s”! Esse par de orelhas grandes custou muito tempo para pescar o óbvio. A cisma começou com a palavra “Espanha” que é mais do que uma simples palavra, é a mãe da língua. Então, o “s” não sai e o “E” vem com força: Ê-panha. A gota d’água foi sentado na mesa de um restaurante, mais precisamente quando pedira uma cerveja e o garçom questionou: “Ê-cudo?” Antenado, notei a falta da letrinha; me senti o conquistador da América Espanhola. E pronto pra novas conquistas idiomáticas!

Claro que terei que ser menos vagabundo do que o inventor de línguas que assassinou o pobre do “s”, ou seja, sem preguiça: tenho que dar um gás no idioma para crescer ainda mais.

· Preços
Santiago não é tão caro, diria que está um tanto acima do que gasto em São Paulo, uns 10% se muito a mais. A exceção fica por conta de dois itens básicos: estadia nos albergues e refeições. No caso de estadia, deve ter sido dolarizado e quem sofre são os locais. Mesmo o albergue zoneado custou R$ 25, mais R$ 5 de café da manhã. O dobro do que paguei em Foz de Iguaçu (16), e lá tem piscina, gramado tapete etc. Pra almoçar paguei em média R$ 15. O equivalente aqui cairia pela metade, presumo.

Sobre transportes, bilhetes de metrô e corridas de ônibus estão na mesma faixa. São Paulo – Guarujá é equivalente a uma Santiago – Viña del Mar. E não me pareceu caro o ônibus centro – aeroporto, R$ 10, ida e volta.

Latinha de coca, na mesma proporção. Já a pechinha é por um produto genuinamente chileno: vinho. Paguei 15 Reais no Casilero del diablo, Merlot, o que custa 35 aqui. Só não comprei dois ou três porque a adega não aceitava cartão e estava com poucos Pesos.

· Despedida
Morri com P$ 390 (R$ 2,11), no saguão do aeroporto, uma simples coquinha saía pela bagatela de P$ 800 (4,32). Caçarola! Aeroporto é isso, inflação. O diabo é que estava com sede, troquei com um carioca mais o equivalente a R$ 5 e bebi a desejada coca.Nos ares, da janelinha do air bus da TAM, saquei preciosas fotos da Cordilheira dos Andes, misto flocos de neves e nuvens. Só vendo. Lembrando a cordilheira, a mineira disse que fez um passeio pra lá, em que se vai todo empacotado de roupas e se anda 3h30 pra ir e outras pra voltar. Deve ser louco, custou R$ 80.